O novo livro abrangente de Ian Urbina traça um caminho através de águas turbulentas
Os recifes de coral não eram coisa de Ian Urbina. Ele percebeu que eram coloridos, que os mergulhadores os adoravam e que certas espécies precisavam deles para sobreviver. Mas, como escreve o jornalista em seu novo livro, O oceano fora da lei: jornadas pela última fronteira indomada (Agosto de 2019), “houve um tempo em que eu via os corais como pouco mais do que rochas glamorizadas”.
Isso mudou em 2017, quando Urbina relatou um esforço feroz para impedir três empresas petrolíferas de perfurar na costa do Brasil. Com medo de que a perfuração colocasse em risco um recife de 621 milhas de extensão, um grupo de cientistas brasileiros juntou-se ao Greenpeace não apenas para tentar salvar o recife, mas também para mudar a percepção global sobre o oceano. “Menos destinado a encher as nossas carteiras ou estômagos”, escreve Urbina sobre as opiniões dos activistas, “o oceano foi uma oportunidade para expandir a nossa humanidade, promover a biodiversidade e provar a nossa capacidade de viver em equilíbrio com o resto dos ocupantes do planeta”.
Urbina logo ficou maravilhado com as sofisticadas táticas de caça dos corais, sua experiência na construção de recifes e como um recife de dois acres pode fornecer abrigo para mais espécies marinhas “do que existem diferentes espécies de aves em toda a América do Norte”. Os conservacionistas brasileiros acabaram por prevalecer na sua luta para suspender o projecto de perfuração. Mas, como fica evidente em quase todas as páginas do livro de Urbina, os humanos estão muito longe de viver em paz com o oceano e os seus habitantes.
Isto foi sublinhado na semana passada, quando o Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas publicou um relatório terrível sobre os efeitos “sem precedentes e duradouros” que as emissões de gases com efeito de estufa tiveram nos ecossistemas marinhos. “O aquecimento e a acidificação dos oceanos, a perda de oxigénio e as alterações no fornecimento de nutrientes já estão a afectar a distribuição e a abundância da vida marinha nas zonas costeiras, no oceano aberto e no fundo do mar”, concluiu o relatório.
As alterações climáticas são certamente um dos maiores problemas que ameaçam os oceanos, mas como Oceano Fora da Lei deixa claro que a lista de ameaças é deprimentemente longa. Extraído da série escrita por Urbina e publicada em O jornal New York Times de 2015 a 2016, O oceano fora da lei é uma investigação alarmante e poderosa sobre as inúmeras crises ambientais e humanitárias que ocorrem nos oceanos do mundo. Poluição, pirataria, pesca excessiva, caça às baleias, escravatura e caça furtiva são todas abordadas aqui, muitas vezes com detalhes trágicos. E como Urbina relata ao longo do livro, pouco está sendo feito para impedir isso. Os oceanos são predominantemente locais sem lei, onde as reivindicações jurisdicionais são frequentemente contestadas de forma violenta e os poluidores envenenam ecossistemas inteiros com pouco receio de serem processados. As pessoas estão literalmente escapando impunes de assassinatos por aí.
“As leis marítimas que existem”, escreve Urbina, “são muitas vezes desconcertantes, contraditórias e confusas”.
Como consequência, tais leis raramente são respeitadas. Urbina dedica um capítulo do seu livro ao violento impasse entre a agência de pescas da Indonésia, cujas patrulhas marítimas impõem a proibição nacional de barcos de pesca estrangeiros nas suas águas, e a Guarda Costeira vietnamita, que vem resgatar dezenas de pescadores presos no mar pelos indonésios. Como a pesca excessiva de uma nação nas suas próprias águas muitas vezes leva à caça furtiva nas águas de outra, conflitos como este repetem-se em todo o mundo. Urbina também visita Palau, um pequeno arquipélago no Pacífico ocidental cujas leis de conservação marinha são as mais agressivas do mundo. Ainda assim, caçadores ilegais da China, de Taiwan e de outros lugares pescam rotineiramente – e ilegalmente – perto das ilhas Palauan.
“O oceano não é o lugar para procurar narrativas de mocinho versus bandido”, adverte Urbina, embora destaque indivíduos que arriscam suas vidas para proteger ambientes marinhos. Estes incluem Chris Keays, um engenheiro escocês que em 2013 descobriu que o navio de cruzeiro da Carnival Corporation em que trabalhava estava a bombear resíduos tóxicos para o oceano, a fim de evitar o pagamento de milhões em taxas de eliminação exigidas. Três anos depois, graças em parte à denúncia de Keays, a Carnival foi multada em 40 milhões de dólares, “a maior penalidade deste tipo na história náutica”. Keays, temendo represálias de seus colegas da indústria de cruzeiros, encontrou trabalho em terra.
“A impunidade é a norma no mar, não apenas por causa da falta de fiscalização”, escreve Urbina, “mas também devido ao elenco de personagens que, com credenciais e motivos questionáveis, são deixados para assumir a responsabilidade”.
Para ilustrar este ponto, Urbina abre e fecha O oceano fora da lei com a Sea Shepherd, o grupo ambientalista vigilante que ficou famoso pela série Animal Planet Guerras de Baleias. Em 2014, Urbina acompanhou a Sea Shepherd enquanto perseguia uma traineira de pesca de bandeira nigeriana através dos oceanos Sul e Índico durante 110 dias e mais de 11.550 milhas náuticas. A perseguição implacável e perigosa resultou no naufrágio da traineira após um aparente ato de auto-sabotagem por parte de seu capitão. O capítulo final do livro detalha as campanhas anti-caça às baleias, conflituosas e legalmente “obscuras” da Sea Shepherd, pelas quais “a organização é odiada e reverenciada”. Grupos como a Sea Shepherd existem, sublinha Urbina, porque os órgãos governamentais responsáveis pela protecção dos nossos oceanos muitas vezes não o fazem.
Num apêndice, Urbina oferece sugestões sobre como os indivíduos podem ajudar a “mitigar o caos offshore” e partilha recomendações de defensores e investigadores sobre como melhorar o policiamento no oceano. Se tudo parece opressor e quase impossível, esse é o ponto. Ao narrar as muitas coisas horríveis que estamos fazendo no oceano, o livro de Urbina apenas faz o leitor querer salvá-lo ainda mais.