Animais

Onde estão as coisas selvagens à noite

Santiago Ferreira

Poucos humanos são noturnos, mas muitos outros animais são

Eu nunca me considerei ao ar livre. Não é que eu não gostasse de estar ao ar livre, mas associava “fora” ao dia, e o dia era um mundo ao qual nunca pertenci.

Tenho um distúrbio do ritmo circadiano chamado distúrbio da fase retardada do sono, ou DSPD. É algo de família, mas meu caso é extremo: fico cansado quando o sol nasce e acordo quando ele se põe. Isso me deixou dentro de casa por padrão. Quando outras pessoas estão caminhando ou andando de caiaque, estou na cama, dormindo.

Uma noite, pesquisando “noctívagos” no Google, me deparei com a imagem de uma câmera infravermelha apontada para um ninho. Ficava a alguns milhares de quilômetros de distância, na curva de uma árvore, sob o arco extenso de um galho de pinheiro. No centro do ninho estava uma verdadeira coruja noturna: uma grande coruja com chifres, seus olhos brilhando como enormes luas paralelas.

Por fim, ela se levantou para esticar as pernas e vi que ela estava sentada em um ovo. Ela o rolou entre os pés e depois o colocou de volta na posição. Acordada, acordada, ela sentou-se.

A partir de então, observei-a constantemente. Durante o dia, os espectadores da câmera da coruja chegavam às centenas, mas à noite, às vezes éramos só eu e ela. Eu me ajustava na cadeira da minha escrivaninha. Ela mudaria em seu ninho. Eu faria um sanduíche na minha cozinha escura. Ela receberia a entrega – uma coruja macho passando-lhe uma caça fresca, que ela devoraria inteira, emitindo pequenos gorjeios felizes enquanto eu enxugava a boca com um guardanapo. Durante o dia, ela ainda estava lá, dormindo no meu telefone ao lado do meu travesseiro. Às vezes éramos acordados por vizinhos barulhentos (corvos no caso dela, humanos com ferramentas elétricas no meu), mas na maioria das vezes dormíamos, o sol penetrando pelas frestas das persianas da minha janela, suas penas agitando-se suavemente ao vento.

Eu ainda estava observando quando uma rachadura em forma de estrela apareceu na superfície do ovo. Mais tarde, observei a corujinha crescer, os discos circulares achatando-se ao redor dos olhos e os minúsculos tufos das orelhas brotando. Observei enquanto ele aprendia a engolir presas e praticava habilidades de caça em uma pinha. Observei enquanto ele batia as asas com fervor, até que uma noite ele voou.

Quando a corujinha foi embora, a mãe foi embora com ela.

Achei que eles poderiam voltar, mesmo que apenas para dormir, mas a câmera permaneceu apontada para um ninho vazio. Sem a companhia deles, senti uma vontade repentina de sair.

Lá fora não era o ar livre que todos elogiam. Não havia grama verde, nem céu azul, apenas tons de cinza e sombra. Mas eu conseguia respirar com tranquilidade o ar fresco da noite, que cheirava levemente a borrifos de gambá e flores que desabrochavam à noite. Ao luar, vi coelhinhos brincando nas ruas. Os coiotes esgueiravam-se pela grama e os morcegos voavam como sombras no alto. Eu me perguntei se eles me reconheceriam como um deles, apenas mais uma criatura noturna passando a noite. E o céu! Durante o dia é apenas sol e nuvens, mas à noite é o universo inteiro.

Uma noite, me aventurei na floresta. Estava silencioso, exceto pelo barulho das folhas sob os pés e pelos gemidos estridentes das árvores. Então, de repente, na periferia, um movimento. Antes que eu percebesse o que estava acontecendo, ele mergulhou em um galho logo acima: uma grande coruja com chifres.

Fiquei impressionado com a tridimensionalidade do pássaro, com a reciprocidade do nosso olhar. Ele me encarou por algum tempo, depois se lançou no ar e desapareceu na noite.

Fiquei um tempo naquele local, observando o sol nascer em faixas rosadas no horizonte. Então fui para casa e deixei os pássaros diurnos do lado de fora da minha janela cantarem para eu dormir.

Santiago Ferreira é o diretor do portal Naturlink e um ardente defensor do ambiente e da conservação da natureza. Com formação académica na área das Ciências Ambientais, Santiago tem dedicado a maior parte da sua carreira profissional à pesquisa e educação ambiental. O seu profundo conhecimento e paixão pelo ambiente levaram-no a assumir a liderança do Naturlink, onde tem sido fundamental na direção da equipa de especialistas, na seleção do conteúdo apresentado e na construção de pontes entre a comunidade online e o mundo natural.

Santiago