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O quebra-cabeça da natureza: por que algumas espécies são raras e outras comuns?

Santiago Ferreira

No cerne da biodiversidade da Terra reside uma questão fundamental: Porque é que certas espécies prosperam em abundância, enquanto outras espécies são perigosamente raras? Um estudo recente e inovador lançou luz sobre este mistério, oferecendo novos insights sobre um debate que está em curso desde a época de Darwin.

Um padrão, há muito observado na natureza, tornou-se mais evidente com mais de um século de dados: a maioria das espécies é, curiosamente, rara, mas não excessivamente. Enquanto isso, apenas algumas espécies selecionadas dominam em número.

Distribuição de espécies

Este fenómeno, conhecido como distribuição global de abundância de espécies (gSAD), foi documentado de forma mais conclusiva para certas espécies, como as aves.

Porém, quando se trata de insetos e vários outros, a clareza desaparece. Esta foi a principal descoberta feita por uma equipe internacional liderada pelo Centro Alemão de Pesquisa Integrativa da Biodiversidade (iDiv).

A pesquisa, publicada na revista Ecologia e Evolução da Naturezadestaca o papel vital do monitoramento da biodiversidade na captura da essência diversificada da vida em nosso planeta.

O enigma da distribuição das espécies não é novo. Charles Darwin, há mais de 150 anos, ponderou na sua obra revolucionária, “A Origem das Espécies”: “Quem pode explicar porque é que uma espécie se espalha amplamente e é muito numerosa, e porque é que outra espécie aliada tem uma distribuição estreita e é rara?”

Dois modelos principais

Esta questão desencadeou a exploração do gSAD, levando à proposição de dois modelos primários no século passado.

A primeira, apresentada por RA Fisher – um renomado estatístico e biólogo – afirmou que a grande maioria das espécies é excepcionalmente rara. Esta perspectiva, conhecida como modelo de série logarítmica, implica que as espécies comuns são uma minoria.

Por outro lado, FW Preston, engenheiro e ecologista, apresentou o modelo log-normal, sugerindo que as espécies verdadeiramente raras são poucas e raras, com a maioria exibindo um nível intermediário de abundância. No entanto, até este estudo recente, a comunidade científica permanecia dividida sobre qual modelo representava verdadeiramente o gSAD da Terra.

Foco do estudo

Para resolver este enigma, os investigadores analisaram dados do Global Biodiversity Information Facility (GBIF), que contém mais de mil milhões de observações de espécies desde 1900 a 2019.

Corey Callaghan, autor principal do estudo, elogiou a base de dados GBIF, reconhecendo a sua importância em “reunir dados recolhidos de cientistas profissionais e cidadãos de todo o mundo”. Os dados foram meticulosamente categorizados em 39 grupos de espécies, de aves a mamíferos, cada um com seu gSAD único.

O que os pesquisadores aprenderam

A análise revelou um potencial padrão universal: a maioria das espécies são raras, mas não excessivamente, uma descoberta consistente com o modelo log-normal de Preston. No entanto, o quadro completo do gSAD surgiu apenas para grupos específicos, como pássaros e cicadáceas. Para outros, os dados permaneceram limitados.

O professor Henrique Pereira, autor sénior do estudo, comentou sobre a mudança intrigante testemunhada com o aumento dos dados: “Começamos a ver que existem, de facto, mais espécies raras do que espécies muito raras. Esta mudança, evidente para aves e cicadáceas, ilustra a revelação da distribuição completa da abundância de espécies como Preston imaginou.”

No entanto, como enfatizou Callaghan, ainda há uma vasta extensão de biodiversidade a ser mapeada. “Embora tenhamos registado observações durante décadas, apenas levantamos o véu para alguns grupos de espécies”, disse ele.

Implicações do estudo

Embora o novo estudo tenha feito progressos na revelação de gSADs para diversas espécies, também abriu portas para outra questão profunda: quantas espécies habitam o nosso planeta? Parece que embora alguns grupos, como as aves, tenham sido exaustivamente documentados, outros, incluindo os insectos e os cefalópodes, permanecem envoltos em mistério.

Estas revelações recentes não só nos aproximam da resposta à pergunta de Darwin, mas também sugerem os possíveis mecanismos ecológicos e evolutivos que moldam a raridade e a abundância das espécies. No entanto, este desafio tornar-se-á muito mais complicado à medida que as ações humanas continuarem a remodelar a biodiversidade da Terra.

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Santiago Ferreira é o diretor do portal Naturlink e um ardente defensor do ambiente e da conservação da natureza. Com formação académica na área das Ciências Ambientais, Santiago tem dedicado a maior parte da sua carreira profissional à pesquisa e educação ambiental. O seu profundo conhecimento e paixão pelo ambiente levaram-no a assumir a liderança do Naturlink, onde tem sido fundamental na direção da equipa de especialistas, na seleção do conteúdo apresentado e na construção de pontes entre a comunidade online e o mundo natural.

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