Animais

Cientistas aspiraram DNA animal do ar em uma floresta e obtiveram resultados surpreendentes

Santiago Ferreira

Numa manhã de outono, um grupo de investigadores do Globe Institute da Universidade de Copenhaga embarcou numa intrigante expedição a uma floresta dinamarquesa. Armados com caixas plásticas, esses cientistas procuraram “aspirar” o DNA animal do ar.

As caixas, equipadas com amostradores de ar de DNA, foram amarradas em troncos de árvores, filtros de ar acoplados e depois ligadas. À medida que as caixas eram ligadas, um leve zumbido indicava que elas estavam coletando partículas transportadas pelo ar.

Nos três dias seguintes, os pesquisadores retornaram à floresta diversas vezes para substituir os filtros de ar, cada vez marcando um passo adiante em sua investigação.

“Vimos relativamente poucos animais no pouco tempo que passamos na floresta quando trocamos os filtros de ar. Um esquilo, o som de um pica-pau, um faisão gritando e um dia uma águia de cauda branca voando acima de nós”, disse Christina Lynggaard. No entanto, a riqueza da biodiversidade que descobriram no ar contrastava fortemente com a falta de actividade visível.

Quais animais foram detectados?

Ao sequenciar as partículas de ADN transportadas pelo ar recolhidas nos filtros, a equipa descobriu um número surpreendente de habitantes da floresta. O processo de “aspiração”, executado durante três dias numa área de floresta aproximadamente equivalente a um campo de futebol, revelou vestígios de ADN de 64 espécies animais.

Eles detectaram o DNA de animais, incluindo espécies domésticas como vacas, porcos, ovelhas, galinhas e cães, e até animais de estimação exóticos, como periquitos e pavões. No entanto, a verdadeira surpresa foi a detecção de cerca de 50 animais selvagens terrestres.

O DNA revelou a presença de animais selvagens de pequeno a grande porte com estilos de vida variados – veado, corça, texugo euro-asiático, águia de cauda branca, raposa vermelha, diferentes espécies de arganaz, tordo, esquilo vermelho euro-asiático, sapo comum, salamandra lisa, grande crista tritão, guindaste, pica-pau-malhado, pica-pau-cinzento, garça-real, chapim-do-pântano, galinhola e vários outros.

Resultados surpreendentes

Num espaço de tempo surpreendentemente curto, os investigadores descobriram quase um quarto dos animais terrestres anteriormente registados na área e arredores.

“É absolutamente louco! Embora tenhamos trabalhado muito para otimizar o método, não ousamos esperar resultados tão bons. Não pensávamos que teríamos tanto sucesso na primeira tentativa na natureza”, disse a professora Kristine Bohmann.

ADN animal

O DNA coletado do ar é conhecido como DNA ambiental. “Os animais secretam DNA no ambiente ao seu redor o tempo todo. Pode estar na forma de fragmentos de pêlos, penas e células da pele. Se estiverem no ar, podemos aspirá-los e usar análises de DNA para descobrir de que animais vieram”, explicou Lynggaard.

Esta abordagem inovadora de “aspirar” ADN do ar baseia-se num estudo anterior realizado pela mesma equipa que explorou a presença de ADN animal no ar num jardim zoológico e mapeou a presença de muitos dos seus habitantes.

No entanto, há uma grande diferença entre um jardim zoológico e a natureza, como explicou Bohmann: “Num jardim zoológico, os animais estão presentes em grande número numa área relativamente pequena, enquanto na natureza estão muito menos concentrados. Portanto, não tínhamos certeza de quão bem poderíamos fazer o método funcionar na natureza. E é aí que temos de fazê-lo funcionar se quisermos utilizá-lo para monitorizar a biodiversidade.”

Ferramenta valiosa

O ensaio na floresta dinamarquesa provou que o ADN ambiental transportado pelo ar pode tornar-se uma ferramenta valiosa na monitorização da biodiversidade.

“Estamos numa crise de biodiversidade e são necessárias ferramentas para compreender como os ecossistemas mudam como resultado dos impactos humanos, para orientar estratégias de gestão e para avaliar o risco de propagação de doenças em áreas onde os animais podem entrar em contacto com as pessoas”, disse Lynggaard.

Apesar de lidar com pequenas quantidades de DNA ambiental transportado pelo ar, os pesquisadores não mediram esforços para verificar suas descobertas. Quando detectaram pela primeira vez DNA de pavões, temeram que pudesse ser um erro. Mas após uma investigação mais aprofundada, encontraram residentes locais que confirmaram avistamentos ocasionais de pavões durante as suas caminhadas.

Os resultados iniciais sugerem que este método pode ser eficaz no mapeamento da presença de animais silvestres. O estudo inspira otimismo, embora a técnica precise de mais refinamento e testes. “Isso demonstra um método sensível para mapear a presença de animais sem ter que vê-los ou perturbá-los”, disse o professor Bohmann.

Mais sobre amostragem de DNA no ar

A amostragem de ar de DNA, também conhecida como amostragem de ar de DNA ambiental (eDNA), é uma técnica científica revolucionária para coletar e analisar DNA presente em partículas transportadas pelo ar.

Esta abordagem representa um avanço na pesquisa ecológica e biológica. Abre oportunidades novas e estimulantes para estudar a distribuição de espécies, vigilância de doenças e biodiversidade.

Visão geral

Na amostragem de DNA do ar, os cientistas capturam e analisam ativamente o material genético das amostras de ar. O DNA transportado pelo ar, frequentemente associado a partículas microscópicas como poeira, pólen ou células da pele, fornece um instantâneo ambiental das entidades biológicas presentes em um determinado local.

Metodologia

O processo envolve o uso de filtros de ar ou amostradores especialmente projetados, que coletam partículas transportadas pelo ar do ambiente circundante. Os filtros de ar retêm partículas que transportam DNA, que os pesquisadores extraem e purificam em laboratório.

Após a extração, os cientistas aplicam uma técnica chamada reação em cadeia da polimerase (PCR) para replicar as sequências de DNA coletadas. A replicação permite mais fácil detecção e análise do material genético. Em seguida, eles sequenciam o DNA para identificar as espécies de organismos presentes na amostra.

A aplicação de tecnologias de sequenciamento de alto rendimento, também conhecidas como sequenciamento de próxima geração, melhorou significativamente a precisão de detecção e a capacidade de identificação desta técnica.

Aplicações para amostragem de ar de DNA

O uso de amostragem de ar de DNA se estende a vários domínios. Em ecologia, fornece uma ferramenta não invasiva para estudar a distribuição e diversidade de espécies. Permite aos cientistas monitorizar a presença ou ausência de espécies específicas, incluindo organismos ameaçados, invasivos ou causadores de doenças.

Na saúde pública, a técnica tem enorme potencial na vigilância de doenças. Ao detectar patógenos ou alérgenos transportados pelo ar, os cientistas podem monitorar a prevalência de doenças, auxiliando assim nos sistemas de alerta precoce.

Na área forense, a amostragem de DNA do ar pode ser fundamental nas investigações da cena do crime. Poderia potencialmente detectar a presença de um suspeito através de células da pele ou outros vestígios biológicos deixados no ar.

Limitações e direções futuras

Embora a amostragem de DNA no ar seja promissora, ela tem suas limitações. Questões como a contaminação potencial, a distribuição desigual do ADN transportado pelo ar e a necessidade de bases de dados de referência abrangentes para a identificação precisa das espécies podem constituir desafios.

São necessários mais refinamentos e testes da técnica. No entanto, o potencial da amostragem de ADN no ar é vasto e a investigação em curso continua a expandir as suas aplicações. À medida que a metodologia for melhorando, provavelmente se tornará uma ferramenta cada vez mais importante para o monitoramento da biodiversidade e para a pesquisa ecológica.

Em resumo, a amostragem de DNA no ar é uma técnica promissora que aproveita a onipresença do DNA transportado pelo ar. Oferece um meio não invasivo de estudar e monitorar a biodiversidade de um ambiente, rastreando doenças e potencialmente auxiliando em investigações forenses. Apesar das suas limitações, a técnica possui um imenso potencial e representa uma fronteira emocionante na investigação biológica e ecológica.

Santiago Ferreira é o diretor do portal Naturlink e um ardente defensor do ambiente e da conservação da natureza. Com formação académica na área das Ciências Ambientais, Santiago tem dedicado a maior parte da sua carreira profissional à pesquisa e educação ambiental. O seu profundo conhecimento e paixão pelo ambiente levaram-no a assumir a liderança do Naturlink, onde tem sido fundamental na direção da equipa de especialistas, na seleção do conteúdo apresentado e na construção de pontes entre a comunidade online e o mundo natural.

Santiago