Animais

Grandes herbívoros nem sempre são prejudiciais em novos territórios

Santiago Ferreira

Uma análise abrangente liderada por Erick Lundgren desafia as visões convencionais sobre o impacto ecológico dos grandes herbívoros, lançando luz sobre os verdadeiros impulsionadores das mudanças na abundância e diversidade das plantas.

A investigação, que se baseia em mais de 200 estudos em seis continentes, apresenta um argumento convincente de que as características físicas e os hábitos alimentares dos grandes herbívoros desempenham um papel mais significativo na formação dos ecossistemas do que a classificação binária de serem espécies nativas ou não-nativas.

Espécies introduzidas

A perspectiva tradicional nos estudos ecológicos e de conservação tem sido frequentemente a de que os animais não nativos exercem efeitos mais prejudiciais nos seus novos ambientes em comparação com os seus homólogos nativos.

“Grandes mamíferos herbívoros (megafauna) sofreram extinções e declínios desde a pré-história”, escreveram os pesquisadores. “A megafauna introduzida neutralizou parcialmente essas perdas, mas acredita-se que tenha efeitos invulgarmente negativos nas plantas em comparação com a megafauna nativa.”

Políticas equivocadas

Esta crença tem sido a pedra angular de várias políticas de conservação que visam a erradicação ou o controlo de espécies introduzidas – muitas das quais estão à beira da extinção nos seus habitats indígenas.

Tais políticas foram influenciadas pela preocupação de que os animais invasores tenham maiores impactos negativos na vida vegetal e na estabilidade dos ecossistemas.

A meta-análise de Lundgren e colegas, no entanto, pinta um quadro diferente. Depois de analisar cuidadosamente os dados de 221 estudos, os especialistas não encontraram provas significativas que apoiassem a noção de que a origem desta megafauna – quer sejam nativas ou introduzidas – dita o seu impacto na diversidade e abundância das plantas.

Dinâmica ecológica

Além disso, a investigação investiga outros factores potenciais, como a capacidade de invasão das espécies, o seu estatuto selvagem, a história evolutiva com a flora local e a sua singularidade filogenética e funcional – apenas para descobrir que estes também não conseguem explicar as variações nos ecossistemas vegetais.

Os principais fatores que emergiram deste extenso estudo são as características físicas e funcionais da megafauna, especificamente o tamanho do corpo e as preferências alimentares. Estes elementos são identificados como tendo um efeito mais pronunciado na dinâmica ecológica entre os grandes herbívoros e a vida vegetal.

Mudando o foco

Os resultados do estudo sugerem que é necessária uma mudança de foco, desde a origem dos grandes herbívoros até à forma como as suas características biológicas intrínsecas influenciam as suas interacções com o ambiente.

Os investigadores defendem uma abordagem mais matizada para estudar o impacto da megafauna introduzida, enfatizando a importância da ecologia funcional – um ramo da ciência que estuda os papéis e funções das espécies no seu habitat – em vez da dicotomia simplista nativa versus não nativa.

Os especialistas defendem uma separação entre os aspectos normativos sobre se os grandes herbívoros “pertencem” aos seus ambientes e a análise objectiva das suas funções ecológicas.

Implicações do estudo

Esta investigação não só desafia as narrativas prevalecentes na ciência da conservação, mas também estimula uma reavaliação das estratégias de gestão e conservação relativas aos grandes herbívoros em todo o mundo.

“Argumentamos que os efeitos da megafauna introduzida devem ser estudados como qualquer outra vida selvagem seria estudada, através das lentes da ecologia funcional, com as dimensões normativas do seu ‘pertencimento’ consideradas separadamente e com transparência”, escreveram os autores do estudo.

O estudo está publicado na revista Ciência.

—–

Gostou do que leu? Assine nosso boletim informativo para artigos envolventes, conteúdo exclusivo e as atualizações mais recentes.

—–

—–

Santiago Ferreira é o diretor do portal Naturlink e um ardente defensor do ambiente e da conservação da natureza. Com formação académica na área das Ciências Ambientais, Santiago tem dedicado a maior parte da sua carreira profissional à pesquisa e educação ambiental. O seu profundo conhecimento e paixão pelo ambiente levaram-no a assumir a liderança do Naturlink, onde tem sido fundamental na direção da equipa de especialistas, na seleção do conteúdo apresentado e na construção de pontes entre a comunidade online e o mundo natural.

Santiago