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Natureza e Design

Maria Júdice Borralho

O Design, talvez agora mais do que nunca, procura explicita ou implicitamente inspiração no mundo natural. E quando se trata de tornar belos os objectos do quotidiano, a Natureza tem muitas sugestões à espera de serem encontradas.

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Uma nova consciência ambiental vem crescendo e a palavra “desenvolvimento” começa a ser repensada no seio de vários sectores, nomeadamente dos que contribuiram para acelerar a crise ambiental. Trata-se de travar a invasão sobre a NATUREZA, a civilização e as culturas.

O design, colado às novas condições económicas e tecnológicas da vida moderna, dá sinais de estar sensível a este fenómeno. Depois de responder ao apelo ao consumo, traduzido pela procura sempre crescente de novos objectos que proporcionam padrões de vida cada vez mais solicitados, e de contribuir para alimentar a tese de que os bens materiais são a base da realização humana manifesta comportamentos que, de um modo ou de outro, contrariam ou minimizam rumos anteriormente definidos. Pedro Brandão prova-o em TEMPO DO DESIGN – Anuário 2000 quando afirma: “Hoje o design profissional deverá estar consciente de que o processo de desenvolvimento não se mede pelo consumo dos produtos, imagens ou ambientes mas por um conjunto amplo e subtil de factores sociais e culturais. Para poder ver reconhecida a sua responsabilidade social, o designer terá de fazer este caminho.”

Algumas das peças expostas no MUSEU DO DESIGN DE LISBOA (Centro Cultural de Belém) registam esta tendência. Ou facilmente visível ou exigindo uma observação mais atenta apercebemo-nos que um novo sentido emerge delas.


Fotografias de José Romão

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O MUSEU DO DESIGN DE LISBOA expõe um conjunto de objectos da vida quotidiana. Perderam a função prática a sua utilidade, mas adquiriram um significado novo, um novo espírito, que os torna equivalentes a obras de arte. A colecção pertence a Francisco Capelo. No livro MUSEU DO DESIGN, o coleccionador atribui-lhe a função. Diz ele “aquilo que procuro fazer ao coleccionar” … é “reunir do mundo das coisas aqueles objectos que, pela sua natureza, possam falar às gerações futuras deste tempo, deste século que foi o meu”.

 
 
Que diferença há entre estas peças concebidas por designers – cadeiras, mesas, estantes, etc. e as que recheiam a maior parte das nossas casas? Ou melhor, o que é o design? Cristina Morozzi, escritora e crítica nesta área, quanto tenta encontrar um significado para a palavra, chega a uma conclusão: “visto que não existe uma definição oficial, cada um pode aplicar a sua”. Em seguida apresenta algumas: “tentativa de projectar uma relação possível entre a indústria e sociedade” (sottsass), “o design trata de tornar belos os objectos do quotidiano” (Settimana Egnimistica), “morcego, meio rato e meio pássaro” (Klaus Koenig).

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Como todas as actividades humanas, das mais importantes às mais triviais, brotaram da mente do Homem com um propósito, ocorre perguntar: Onde vai o design buscar a inspiração? Que ideais o movem? As fontes inspiradoras e os seus desígnios, serão múltiplos mas torna-se claro que a NATUREZA e talvez ideais ecológicos, estão na origem de muitos. A cadeira de braços ELEFANTE, a mesa e cadeiras TULIPA, a cadeira de braços ROSA, o sofá PÔR-DO-SOL EM NOVA YORK e a espreguiçadeira de baloiço BIRD (pássaro) expostas no MUSEU DO DESIGN DE LISBOA, confirmam-no.

Esta última, pelas suas características, merece um tratamento particular.

Rudolf Arnheim, no livro PARA UMA PSICOLOGIA DA ARTE, tenta provar que um objecto concebido com uma finalidade prática pode fazer parte do Universo artístico, pela via da sua expressão visual. Não é relevante para esta reflexão concluir que a cadeira PÁSSARO é uma obra de arte, ou não é uma obra de arte. Importa antes descobrir-lhe a expressão.

A palavra “expressão” etimologicamente, implica a acção de “pressionar para fora”.

Aplicada a pessoas e a animais este significado torna-se mais ou menos real, o mesmo não se poderá dizer relativamente a um objecto. O que poderá ser expresso por um objecto desprovido de mente? No caso da espreguiçadeira de baloiço PÁSSARO, captar-lhe a expressão significará conseguir interpretar-lhe as características dinâmicas, descobrir-lhes as tensões e nesta operação a imaginação tem um papel importante.

As dimensões 116 x 50 x 170 cm, a configuração do assento bem mais volumoso do que as costas, e estas, conferem-lhe o aspecto de asas de um pássaro gigante em pleno voo.
Neste momento importa colocar algumas questões:

Porque criou Tom Dixon uma cadeira que sugere a imagem de um pássaro?

Impressionado pela acrobacia das aves? Admirador da sua morfologia externa?

Ou traduz uma preocupação pela extinção de várias espécies e pela ameaça de extinção de outras?

Será tudo isto e também o cumprimento da ordem expressa na metáfora amorosa que todos deviam cumprir NAMOREMOS A TERRA?


Fotografias de José Romão

Uma jovem aluna de arquitectura, sempre que no Centro Cultural de Belém, visita o MUSEU DO DESIGN, detem-se a contemplar a espreguiçadeira BIRD. No fim profere estas palavras: A POMBA DA PAZ.

Será uma pomba da paz colorida.

O poema de Rui Belo, do livro TRANSPORTE NO TEMPO – Gaivota - capta-lhe a expressão:

 A tão difícil paz facilmente alcançada
A máxima inquietação ao fim e ao cabo queda
A serenidade em duas … asas resumida
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Perfeitíssima obra onde tudo se equilibra
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Inúmera serenidade em duas breves asas resumida

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