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Garça-pequena, a menor das garças europeias

Inês Catry

A Garça-pequena é a mais pequena garça europeia, não ultrapassando o tamanho de um pombo. Sofreu acentuado decréscimo em toda a Europa, resultado da desertificação e desaparecimento de áreas húmidas nos locais de paragem migratória.

IDENTIFICAÇÃO E CARACTERÍSTICAS

A Garça-pequena (Ixobrychus minutus) é a mais pequena das garças europeias, com 33-38 cm de comprimento e 52-58 cm de envergadura.

O macho possui a coroa e as zonas superiores do corpo de cor preta e as penas dos dois lados da face de cor cinzenta. A garganta e o ventre são creme, sendo as restantes zonas inferiores de cor amarelada. As fêmeas têm uma plumagem semelhante aos machos, sendo o preto das zonas superiores substituído pelo castanho-escuro. Os olhos são amarelos e as patas esverdeadas. O bico é amarelo ou verde-amarelado, escurecendo na ponta. A base do bico torna-se temporariamente vermelha na época de reprodução. Em voo é visível um painel creme nas coberturas da parte superior da asa. Os juvenis são semelhantes às fêmeas, embora alguns apresentem uma cor mais avermelhada nas regiões inferiores do corpo.

DISTRIBUIÇÃO E ABUNDÂNCIA

A Garça-pequena é uma espécie com uma vasta área de distribuição, ocorrendo nas regiões Paleárctica, Afrotropical e na Australásia, sendo que menos de um quarto da população reproduz-se na Europa. A população europeia inverna essencialmente no Leste de África, desde o Sudão e Etiópia até ao Congo, atingindo ainda a África do Sul. As populações europeias mais numerosas encontram-se no Centro, Este e Sudeste deste continente, com um efectivo particularmente importante na Rússia, Roménia, Ucrânia, Hungria e Turquia. A população total na Europa está estimada em 37.000 a 110.000 casais, depois de um marcado declínio, entre 1970 e 1990, que terá afectado mais de 90% da população e que restringiu grandemente a área de distribuição da espécie. Apenas Portugal, Ucrânia, Bulgária, Suiça e Dinamarca parecem não ter sido afectados por este declínio, ao contrário de países como a França, onde a população regrediu em cerca de 80%.

 

Em Portugal, a distribuição da Garça-pequena não é bem conhecida. Parece encontrar-se preferencialmente na região Centro, nomeadamente no Baixo Mondego e Vale do Sado. É uma espécie estival e os indivíduos que chegam ao nosso país são oriundos da região tropical de África. Não existem estimativas do tamanho da população reprodutora em Portugal, mas este número deverá fixar-se abaixo dos 1.000 casais. É uma espécie acidental nos Açores, Madeira e Selvagens.

ESTATUTO DE CONSERVAÇÃO

No nosso país, a Garça-pequena é uma espécie pouco comum; no entanto tem estatuto de não ameaçada. Está classificada nos Anexos II da Convenção de Berna e Directiva Aves.


FACTORES DE AMEAÇA

O declínio da população europeia parece ter ocorrido a partir da década de setenta e não pode ser somente atribuído à destruição do habitat ou à pressão humana nas áreas de reprodução, já que esta é uma espécie relativamente tolerante à presença humana. Apesar da sua protecção em extensas áreas húmidas, ela acabou por desaparecer.

 

O declínio verificado parece relacionado com uma elevada mortalidade durante a migração ou nas áreas de invernada, em África. Durante a migração, a Garça-pequena atravessa o Mediterrâneo e o Sara. A prolongada seca que afectou a região do Sara nos anos setenta e o Leste de África em anos mais recentes, provocou a desertificação e a perda de zonas húmidas usualmente utilizadas pela espécie como locais de paragem, fazendo assim aumentar a travessia trans-sariana.

Nalguns países europeus, como a Bélgica, Holanda e França, o desaparecimento da espécie de algumas zonas húmidas está relacionado com a destruição dos caniçais, limpeza das margens dos cursos de água e com a crescente poluição.

HABITAT

A Garça-pequena visita um vasto número de habitats de água doce, que incluem caniçais, cursos de água com densa vegetação, lagoas costeiras, pauis, valas em zonas de arrozal e barragens, entre outros. É uma espécie solitária que não necessita de grandes áreas para se reproduzir ou alimentar.

 


ALIMENTAÇÃO

A sua alimentação é variável, dependendo da época do ano e do local, embora seja essencialmente constituída por peixes, anfíbios e insectos. Inclui ainda na sua dieta moluscos, crustáceos, aranhas, larvas, pequenos mamíferos e ovos e pequenas crias de aves. É uma espécie de hábitos crepusculares, que se disfarça na vegetação, esperando imóvel pelo momento de capturar a sua presa.

REPRODUÇÃO

A Garça-pequena é uma espécie territorial durante a época de nidificação. O macho defende o território enquanto inicia a construção do ninho. Uma vez encontrada a parceira, esta ajuda-o na construção do ninho, fazendo apenas uma postura, de princípios de Maio a inícios de Junho, geralmente de 5-6 ovos. Ambos os progenitores incubam durante 17-19 dias e ao fim de 25-30 dias os juvenis estão aptos a voar.


MOVIMENTOS

É uma ave migratória e dispersiva. A dispersão após a emancipação dos juvenis ocorre do fim de Julho ao início de Setembro, sem direcção precisa. Posteriormente, os juvenis juntam-se às aves adultas que rumam para Sul, em Agosto/Setembro. Alguns indivíduos, poucos e essencialmente juvenis, permanecem na Europa após o mês de Outubro. As principais áreas de invernada situam-se no Leste africano. O retorno através da Bacia do Mediterrâneo inicia-se em meados de Março; as áreas de nidificação da Europa Central são reocupadas em Abril e primeira semana de Maio.

 


CURIOSIDADES

A Garça-pequena não necessita de extensas áreas de caniçal para nidificar: três ninhos desta espécie foram descobertos numa área de apenas 1800 m2.

Os progenitores podem transportar as crias de um local para outro quando se sentem ameaçados. Foi observada uma tentativa, coroada de êxito, de transporte de 3 crias (com 2, 3 e 4 dias) no bico de um dos progenitores, de um ninho destruído para um ninho novo, 3 metros ao lado.

LOCAIS FAVORÁVEIS DE OBSERVAÇÃO

No nosso país a espécie encontra-se amplamente distribuída por locais com vegetação palustre, que incluem lagoas, açudes, cursos de água e barragens. Observável de Março a Setembro, citam-se aqui alguns dos locais onde a espécie pode ser observada: Paul de Arzila, Quinta do Taipal, Paul do Boquilobo, Estuário do Tejo, Barragem do Caia, Lagoa de Santo André e Ria Formosa.

BIBLIOGRAFIA

Farinha, J.C. e H. Costa (1999). Guia de Campo das Aves aquáticas de Portugal. Instituto da Conservação da Natureza, Lisboa.

Snow, D.M. e C.M. Perrins (Eds.) (1998). The birds of the Western Palearctic. Concise Edition; vol. 1 Non passerines. Oxford University Press.

Tucker, G.M. e M.F. Heath (1994). Birds in Europe: Their Conservation Status. Birdlife Conservation Series nº 3.

Voisin, C. (1991). The Herons of Europe. T & AD POYSER. London.

 

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