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As Alterações Climáticas e os Fogos Florestais

Cristina Pereira

As alterações climáticas são fenómenos naturais que ocorrem desde a formação da Terra. No entanto, no último século estas têm sido mais pronunciadas e preocupantes, levando a comunidade científica mundial a dar prioridade ao estudo deste fenómeno.

As causas para o aumento da temperatura relacionam-se com os chamados gases com efeito de estufa (GEE). Os GEE, como o dióxido de carbono, o metano ou o óxido nitroso, retêm a radiação infravermelha emitida pela superfície da terra, impedindo que parte desta seja libertada para o espaço. Se este processo permite a vida na Terra, impedindo que esta se torne demasiado fria, o aumento da libertação de GEE, resultante das actividades humanas (principalmente actividades industriais e transportes), origina o aumento da temperatura da troposfera. 


Adaptado de gasa3.dcea.fct.unl.pt/gee/25feb/enquadramento.html

Em 1990, num relatório do Painel Intergovernamental das Alterações Climáticas (PIAC - organismo internacional que se dedica ao estudo das AC), é comprovada cientificamente a existência de AC. Este facto impulsiona decisores e políticos para a assinatura, em Junho de 1992, no Rio de Janeiro, da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas. A Convenção comprometia os 154 países signatários a estabilizar as concentrações dos GEE na atmosfera a um nível que evitasse interferências perigosas das actividades humanas no sistema climático do Planeta.

O segundo relatório do Painel, em 1995, vai ainda mais longe, ao estabelecer as AC como resultado das intervenções humanas sobre o meio natural, com repercussões à escala regional e global. Neste relatório previam-se alterações climáticas entre 1º e 3.5ºC até 2100 e uma subida do nível médio das águas do mar entre 15 e 95 cm.

Em 1997, ainda no âmbito da Convenção, assina-se o Protocolo de Quioto. Trinta e nove países industrializados, dos 160 participantes, comprometeram-se a limitar durante o período de 2008-2012 as suas emissões de GEE.

As reduções acordadas incidiam sobre:
 
- dióxido de carbono (CO2)

- metano (CH4)

- óxido nitroso (N2O)

- hidrofluorcarbonetos (HFCs)

- hidrocarbonetos perfluorados (PFCs)

- hexafluoreto de enxofre(SF6)
 
Os níveis de referência adoptados foram os de 1990 e as reduções representavam, em média, 5%; a União Europeia, negociando em bloco, comprometia-se a uma redução de 8%.

No Protocolo de Quioto, uma forma inteiramente inovadora é preconizada para promover uma redução significativa dos GEE – as transacções comerciais entre países - sob três formas: comércio de emissões, implementação conjunta e mecanismos de desenvolvimento limpo, este último só para depois de 2008. O princípio é apostar numa redução que seja economicamente vantajosa, pois desta forma será mais efectiva e realista.

A implementação do Protocolo ficou condicionada à ratificação por 55 países que detivessem em conjunto 55% da cota de emissões globais. Na prática, os EUA, que nesta matéria defendiam posições muito diferentes das da UE, ficaram com o poder de veto. Com a actual posição de não ratificação do Protocolo, por parte da Administração Bush, aguarda-se a decisão do Japão e da Austrália, que permitirá a implementação do Protocolo. 

A situação em Portugal

As negociações do Protocolo de Quioto, no seio da UE, foram favoráveis a Portugal, dado o nosso país ter baixas emissões; assim, foi-nos permitido aumentar a cota nacional de emissão em cerca de 27% para o conjunto dos GEE e, no caso do C02, em cerca de 40%.

No entanto, os dados mais recentes apontam para uma derrapagem destes números; com as emissões de GEE a superarem em 4% o limite que terá de ser respeitado até 2008 – 2012; apenas entre 1999 e 2000 verificou-se um aumento de emissões em cerca de 31%.

O Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC) previa um cenário mais optimista de apenas 1% acima do limite definido. Este Programa enuncia medidas para reduzir as emissões de GEE, como a produção de electricidade a partir de energias renováveis, o controlo de emissões na fonte, a reformulação do imposto automóvel em função das emissões de C02, a redução dos incêndios florestais e a eficácia e eficiência da exploração e gestão florestal.

O relatório de 2001 do PIAC reforça a componente antropogénica das AC, referindo, para o período entre 1990 e 2100, aumentos da temperatura média entre 1,4º e 5.8º C e do nível médio das águas do mar entre 9 e 88 cm, dependendo do cenário de desenvolvimento considerado. Este relatório prevê que os efeitos negativos das AC superem os positivos, afectando principalmente as regiões tropicais e subtropicais, onde se situam muitos países carenciados, sem meios para fazer face a estes desequilíbrios. Assim, muitas regiões costeiras ficarão inundadas, os desertos avançam e numerosas ilhas correm o risco de desaparecer. Os impactos na saúde humana serão, também, negativos, com a possibilidade de vectores de algumas doenças, poderem deslocar-se para outros locais, agora mais quentes. Temperaturas elevadas podem causar mortalidade junto da população idosa e aumentar a poluição da água e do ar, ambas com efeitos negativos sobre a saúde humana.


As consequências das alterações climáticas em Portugal

O projecto SIAM (www.siam.fc.ul.pt/HOME.html) estuda, a nível nacional, o impacte e a vulnerabilidade dos sistemas naturais e sociais às potenciais alterações climáticas em Portugal, com vista ao desenvolvimento de estratégias e políticas de adaptação e mitigação dos efeitos negativos dessas alterações.

Os primeiros resultados do estudo, apresentados em finais de 2001, indicam que, em termos médios, para todo o território continental, as temperaturas poderão subir entre 4ºC - 7ºC nos próximos cem anos e que, no interior, esta subida poderá ser ainda maior. Quanto à precipitação anual, tudo indica que haverá um aumento da chuva no Inverno, mas um decréscimo substancial nos meses de Primavera, sobretudo em Abril e Maio. 

A verificarem-se estes resultados poderá ser necessário:


· um maior investimento em medidas de protecção, como paredões, esporões ou recuo de frentes urbanas, para fazer face à erosão costeira;

· no sector agrícola, mudanças das datas das sementeiras e das colheitas, selecção e melhoramento das variedades melhor adaptadas a um clima mais quente e seco e adequação de práticas culturais;

· no sector energético, potencial para um acréscimo na produção de electricidade e na utilização de painéis solares, mas também um aumento no consumo de energia, devido às necessidades de arrefecimento.


Em termos de saúde pública as AC poderão conduzir a um provável aumento de doenças transmitidas pela água e pelos alimentos, sobretudo devido às biotoxinas e elementos patogénicos, e ao aumento de doenças relacionadas com a poluição atmosférica e de doenças transmitidas por insectos e roedores, uma vez que o clima favorecerá a sua proliferação.


A importância da floresta nas alterações climáticas

Como já referimos, o PNAC enuncia como medidas a redução dos incêndios florestais e a eficácia e eficiência da exploração e gestão florestal. 

 

De que modo pode a floresta ajudar a combater este problema?

A fotossíntese que ocorre nas plantas terrestres permite a retenção do C02 no material vegetal e, eventualmente, na matéria orgânica do solo. Durante milhares e milhares de anos esta fixação foi suficiente para compensar o C02 que se ia libertando. No entanto, desde há algumas décadas, com a destruição das florestas naturais e a libertação de grandes quantidades de C02, que a concentração deste gás na atmosfera atingiu níveis elevados.

Para além das florestas, existem outros sink ou sumidouros para o C02, como os oceanos e o solo. No entanto, apenas as florestas e o solo, este último em muito menor escala, têm capacidade de o trocar activamente com a atmosfera, sendo por isso considerados os mais importantes.

Uma das medidas imediatas propostas pelo PNAC é a introdução de instrumentos de natureza financeira e fiscal, como o Fundo de Investimento Imobiliário Florestal. Os objectivos do Fundo compreendem o aumento da dimensão média das explorações e a melhoria na composição e estrutura produtiva dos povoamentos, duas medidas que irão permitir aumentar a eficiência da floresta portuguesa no sequestro do carbono atmosférico. O lançamento de um Fundo com estas características encontra-se agendado para breve.

Os sumidouros naturais e o Protocolo de Quioto

Esta capacidade de retenção e armazenamento do carbono pelas florestas a longo prazo representa um dos pontos importantes no debate do ciclo global do carbono e nos impactes das AC, de tal forma que é considerada no Protocolo de Quioto. No entanto, a avaliação correcta dos stocks existentes nos ecossistemas e o sentido dos fluxos (de ou para a atmosfera), são ainda áreas novas de investigação, onde subsistem muitas dúvidas. Daí os cuidados tidos pela UE na aceitação das florestas como sumidouros no âmbito do Protocolo de Quioto, posição muito diferente da assumida pelos EUA, que pretendiam ver as florestas contabilizadas no comércio de emissões. A contabilização dos sumidouros na sua totalidade poderia permitir a um país atingir as suas metas de redução sem um esforço activo e sem uma redução líquida das emissões, contrariando o espírito do Protocolo.


As consequências dos fogos florestais nas emissões nacionais

Os fogos florestais atingem todos os anos, em Portugal, largos milhares de hectares de povoamentos florestais e mato, a um ritmo que não tem abrandado, apesar das inúmeras medidas preventivas e de combate, que têm vindo a ser realizadas.

Para além das perdas económicas e de diversidade associadas aos fogos, estes produzem efeitos adversos no ambiente, pelas grandes quantidades de C02 que libertam.

A par das emissões industrias e do sector dos transportes, as emissões de C02 libertadas nos fogos florestais podem ter algum impacto na contabilização nacional de emissões. Assim, cumprir o Protocolo de Quioto passa, também, pela redução do número de fogos e da área ardida. 

As dúvidas que subsistem…

Relativamente à resposta da floresta a este aumento da concentração de C02, cientistas do norte e centro da Europa, onde este mais se fez sentir, têm registado ganhos substanciais da produtividade. Mas se, no curto prazo, poderá haver uma resposta positiva das árvores, devido ao aumento da fotossíntese, o mesmo não se passa necessariamente no longo prazo. E até que nível de C02 pode a floresta absorver? E que espécies ou práticas florestais maximizam essa absorção? A confirmarem-se os dados iniciais de que são as espécies de rápido crescimento as mais capazes de sequestrar o C02, até que ponto as soluções a equacionar serão compatíveis com a manutenção da biodiversidade e dos recursos hídricos? Estas são algumas das questões para as quais os cientistas procuram respostas.

Para mais informações sobre o tema das Alterações Climáticas aconselhamos a consulta dos seguintes sites:

www.ipcc.ch

195.22.0.189/pnac/index.html

www.euronatura.pt

www.epa.gov/globalwarming/index.html

 

Projecto AGRO - “Floresta e Ambiente On Line - Divulgação e Promoção dos Produtos Florestais” - Projecto nº 200 151 00 27 640

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