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Green Jobs

Carlos Rio Carvalho – ERENA (22-05-2009)

A crise transformou a economia sustentável de intenção sempre adiada numa solução inadiável. Neste contexto, o estímulo ao desenvolvimento de bens e serviços ambientais, e em particular ligados à gestão da biodiversidade, torna os empregos verdes numa peça-chave do relançamento da economia.

A grande crise transformou a economia sustentável de intenção sempre adiada numa solução inadiável. A ideia de que é possível ajudar a resolver a crise económica com o mesmo remédio da crise ambiental, ganhou força e visibilidade nos últimos meses. No cenário global das alterações climáticas, os temas da eficiência energética, das energias renováveis e do controlo e processamento de resíduos são áreas maiores de investimento e criação de emprego e, como tal, das políticas públicas orientadas para a solução da crise.

As soluções de mercado para as ameaças ambientais associadas à perda de biodiversidade são mais difíceis de equacionar, embora existam na prática problemas de conservação da biodiversidade que são bem resolvidos pelo mercado, pelo que é necessário aprofundar este caminho. O estudo TEEB lançado em 2007 numa reunião do G8, procura aplicar à perda de biodiversidade a mesma lógica que o relatório Stern aplicou às alterações climáticas. O relatório TEEB, a publicar em 2010, visa encontrar os modos de realizar o valor da biodiversidade e dos serviços dos ecossistemas. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, a Comissão Europeia e os governos da Alemanha e do Reino Unido são os organizadores e financiadores desta iniciativa.


As soluções ligadas ao mercado da biodiversidade não podem ser entendidas como uma desresponsabilização dos poderes públicos. Pelo contrário, o estímulo, construção e regulação destas soluções é algo que não é possível sem o Estado, característica que é bastante evidente nos processos e iniciativas já em curso.

Em Portugal as iniciativas de estímulo à “economia verde”, incidem principalmente na energia, onde existem objectivos claros, capacidade empresarial, condições naturais favoráveis, resultando tudo isto num evidente sucesso.

A gestão da biodiversidade tem também condições para estimular o desenvolvimento e o emprego. Uma fracção muito significativa do território nacional passa hoje por uma crise de utilidade, sendo o rendimento das actividades agrícolas e florestais baixo, por vezes quase inexistente. Ao mesmo tempo esta crise de utilização gera riscos ambientais, dos quais o mais conhecido é o risco de incêndio, e custos associados ao controlo desses riscos. As produções agrícolas e florestais tradicionais de grande parte destes territórios não são hoje competitivas pelo que existe uma tendência para o seu abandono.

Através de uma reorientação de objectivos e estímulos adequados é possível criar valor nestes territórios, porque neles se pode gerir a biodiversidade com impacto positivo. São mais de três milhões de hectares onde é possível aumentar a riqueza e abundância de espécies e habitats com interesse para a conservação. Um programa de investimento privado e público que permita obter efeitos relevantes na conservação da biodiversidade em simultâneo com a criação de produto e emprego permitirá converter a fraqueza da baixa produtividade agrícola e florestal na força de um território qualificado pela conservação da natureza, com novas alternativas para a criação de valor.



É necessário investimento e trabalho para qualificar os territórios através da biodiversidade. É necessário investir em actividades agrícolas, florestais e turísticas de que promovam os valores naturais, é necessário verificar e seguir o estado desses valores, porque a regra essencial é conservar a biodiversidade. É preciso qualificar e certificar a gestão e os produtos agrícolas e florestais, é preciso investir no turismo e em marketing para conceber e distribuir os novos produtos a ele associados. Este programa de investimento poderá ter uma dimensão muito relevante, da ordem das dezenas de milhares de milhões de euros e prolongar-se por várias décadas, contribuindo para o crescimento e o emprego nas regiões de Portugal onde ele é mormente necessário.



Nas últimas décadas foi possível criar e manter o Sistema Nacional de Áreas Protegidas e a Rede Natura 2000. É um bom legado que nos deixam as políticas de conservação com ênfase no ordenamento do território e não na sua gestão. Estas políticas responderam a ameaças que eram principalmente de destruição ou sobre - utilização de recursos naturais. Embora essas ameaças ainda existam, predominam agora outras, associadas ao não uso e ao abandono e é por isso necessário promover a conservação através da gestão. Por isso também é necessário mudar as políticas, ou em certos casos, apenas adaptar políticas Europeias que são virtuosas e que não expressam completamente essa virtude em Portugal.



Essa mudança ou adaptação é particularmente necessária na política de desenvolvimento rural e conservação da biodiversidade, na legislação de impacto e responsabilidade ambiental e na política florestal.

Em ano de eleições seria um excelente sinal se esta questão fosse incluída e serenamente discutida para além das frases de efeito e declarações genéricas de princípios genéricos. Serão os deputados ao Parlamento Europeu que discutirão as perspectivas financeiras 2014-2020, o futuro da política de desenvolvimento rural na Europa, o financiamento da Rede Natura 2000 ou os mecanismos de estímulo a integração da conservação da natureza na actividade empresarial. Os autarcas que agem localmente e têm uma particular responsabilidade no ordenamento do território e no desenvolvimento serão sempre uma parte importante de qualquer programa de requalificação do território, inclusivamente na sua condição de proprietários e gestores.

Nas eleições legislativas será importante conhecer com clareza as opções e propostas dos concorrentes. A integração do desenvolvimento rural com a conservação da biodiversidade, é uma perda de dinheiro ineficiente ou pode ser um factor de desenvolvimento e criação de emprego? Se sim, como? Tutela conjunta da conservação da biodiversidade, floresta e desenvolvimento rural, sim ou não? Qual o modo de estimular o investimento privado na gestão da biodiversidade? Qual é a hierarquia dos temas de conservação da biodiversidade, qual a prioridade na aplicação dos recursos?



Os Green jobs são parte do programa de relançamento da economia dos Estados Unidos. A expressão refere-se à criação de emprego na área da energia, dos resíduos e da água, e nas áreas tecnológicas com impacto no ambiente.

O valor relativo das actividades associadas à gestão da biodiversidade é potencialmente muito maior em Portugal do que nos Estados Unidos. Em Portugal o turismo é muito importante e a sua oferta tem de ser diversificada e é muito elevada a importância relativa do território a valorizar pela gestão da biodiversidade. Por isso o nosso perfil de “empregos verdes” pode e deve incorporar uma componente verdadeiramente verde, o verde dos nossos campos e matas, que muito desleixadamente temos vindo a esquecer.

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