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A importância do coberto vegetal para a Fauna

Luís Miguel Reino

A gestão do habitat de espécies animais de elevado valor de conservação e/ou socio-económico é uma das componentes principais do seu ordenamento. Neste contexto, a manipulação da estrutura e tipo de vegetação são fundamentais para uma gestão bem sucedida.

Por coberto entende-se um conjunto de características físicas e/ou biológicas da vegetação que constituem, pela protecção que proporcionam, recursos essenciais à sobrevivência da fauna. O uso do coberto pode não só variar com o espaço, mas também com o tempo.

Podemos distinguir duas funções principais do coberto para os vertebrados terrestres:

I - Coberto de refúgio - por exemplo, para protecção dos predadores, dos diversos elementos físicos como sejam a protecção térmica nas horas de maior calor e outro tipo de intempéries, de descanso, etc.;

II - Coberto de nidificação - utilizado para a construção dos ninhos e/ou alimentação dos juvenis;

Uma determinada área pode ser rica em coberto de refúgio, todavia, pode mostrar-se inadequada em termos de coberto de nidificação. Obviamente que a dimensão deste problema varia com as zonas onde se pretende gerir a fauna, assim como com as espécies que se pretende beneficiar. Outro aspecto a ter em consideração é o tipo de vegetação que constitui o coberto.


Coberto de refúgio

A regulação da temperatura corporal requer coberto para a protecção e prevenção tanto do arrefecimento como do aquecimento excessivos. A quantidade e qualidade do habitat de refúgio condicionam o êxito reprodutor, a sobrevivência e a mortalidade. Deste modo, o coberto pode constituir um recurso fundamental para o equilíbrio energético dos vertebrados.

Trabalhos realizados com veados Cervus elaphus demonstraram a possibilidade de este tipo de coberto poder ser ainda mais limitante do que os próprios recursos alimentares. Esta possibilidade sugere que nalgumas circunstâncias o aumento da disponibilidade de alimento pode não compensar a perda de energia que pode ocorrer em áreas com fraco coberto de refúgio. Este efeito pode ser particularmente importante nas áreas com Invernos muito rigorosos ou com Verões muito quentes, desempenhando o coberto nestes casos, um papel fundamental na conservação de energia e na sobrevivência dos indivíduos. Por exemplo, os perdigotos podem frequentemente morrer por desidratação, pelo que se chega a ver as progenitoras a fazerem-lhes sombra, demonstrando a importância do coberto de refúgio.

Algumas medidas de gestão do habitat, como sejam a introdução de culturas para a fauna e de sebes podem em determinadas condições melhorar o coberto de refúgio para a fauna, sobretudo em meios que apresentem uma menor disponibilidade de coberto herbáceo e arbustivo. Para que tal se verifique, determinados aspectos deverão ser tidos em consideração, como sejam a superfície, a intercalação espacial, a altura e a densidade de coberto, e o tipo de vegetação, que são as variáveis que determinam o habitat de muitas espécies, conferindo-lhes protecção contra os predadores, condições meteorológicas adversas e de reprodução.


Coberto de nidificação

Frequentemente, o coberto que é adequado para refúgio ou alimentação pode revelar-se pouco ajustado para a nidificação. Em áreas agrícolas, sobretudo nas sujeitas a pastoreio, é fundamental a existência de coberto adequado à nidificação, uma vez que é comum que estas áreas não proporcionem uma vegetação adequada para criar, devido à efemeridade do coberto e à frequência dos trabalhos agrícolas.

 

Diversos estudos em ecologia de aves têm apontado a importância da disponibilidade de locais adequados à nidificação, podendo funcionar como o factor demograficamente limitante, restringindo localmente as densidades na época de reprodução. Por exemplo, alguns estudos têm evidenciado que a variação da qualidade do coberto de nidificação pode afectar a taxa de recrutamento, densidade reprodutora e nível de predação para a perdiz-cinzenta Perdix perdix.


Estes resultados evidenciam que a qualidade do local de nidificação pode ser determinante no sucesso reprodutivo e no posterior recrutamento na população reprodutora. Aparentemente, os indivíduos escolhem os locais mais adequados para a construção do ninho em função duma percepção para uma menor susceptibilidade para a predação. Por exemplo, num estudo com a perdiz-vermelha Alectoris rufa verificou-se que esta espécie nidificava preferencialmente em locais onde se encontra mais protegida dos predadores que coincidiam com pontos com maior altura de coberto. De igual modo, para a codorniz da Virgínia Colinus virginianus, verificou-se que os ninhos não predados, se situavam em locais com uma cobertura de vegetação herbácea mais alta comparativamente aos que tinham sido predados. Para além do mais verificou-se que todos os ninhos não predados estavam associados a uma elevada cobertura de arbustos de tamanho médio.


Estes resultados sugerem que a qualidade do coberto influencia a densidade de reprodução de pelo menos algumas espécies.

Deste modo, a implementação de medidas que visem a melhoria do habitat de coberto (e.g., culturas para a fauna, sebes) podem contribuir para o fomento e melhoria dos recursos para a fauna. Convém notar, todavia, que este tipo de intervenção apenas se justifica se a qualidade do habitat for limitante. Se tal se verificar, as populações podem ser beneficiadas até ao ponto em que outro factor se pode tornar, por sua vez, limitante.

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