Silva Porto e a Natureza: um olhar entre o realismo e o naturalismo

José Marmeleira - Artlink
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Figura maior da pintura naturalista portuguesa do século XIX, Silva Porto deixou-nos uma obra onde o Homem e a Natureza se encontram, em harmonia, numa relação marcada pelo sentimentalismo e pela fidelidade à realidade do campo.

Atravessado por uma forte instabilidade política, Portugal era em meados do século XIX um palco de contradições e dúvidas. A industrialização tardava em arrancar, a burguesia não acertava o passo com as suas congéneres europeias e o País atrasava-se irremediavelmente face às novidades vindas do estrangeiro.

Entretanto em Paris, conduzida pelos pintores de Barbizon vivia-se uma rebelião contra o academismo vigente nas artes. Estes artistas reivindicavam a representação dos afazeres do homem simples, através da pintura praticada ao ar livre, numa aproximação humilde aos motivos da natureza. Um dos acontecimentos que simbolizou a sua afirmação verificou-se quando Gustave Courbet inaugurou a mostra Pavillon du Realisme. Realizada como contraponto à institucional Grand Exposition Universelle, de Louis Napoléon, provocou reacções bastante negativas no seio dos meios artísticos mais conservadores. Estes, teimosamente, reafirmavam a impossibilidade do homem comum ser um objecto digno do olhar da arte.


Charneca de Belas ao Pôr-do-Sol
1879, óleo sobre tela
85 x 150 cm
Museu do Chiado
Lisboa, Portugal

Indiferentes à polémica, os pintores preferiram concentrar as suas atenções nos efeitos que a luz, a atmosfera e a cor podiam propiciar na criação de cenas onde o ser humano, apesar de dominado pela natureza ou pelas condições de vida, surgia como um herói que qualquer um podia encontrar nos arredores da cidade, em qualquer trabalho agrícola.

A um nível técnico, o realismo francês vinha também propor um gesto mais livre baseado na aplicação directa da mancha sobre a tela e na compreensão da luz como elemento criador de diferentes tonalidades, formas e contrastes. Nesta corrente “realista”, que existiu entre 1830 e 1870, destacaram-se, entre outros, Jean-François Millet, Jean-Baptiste Corot e Gustave Courbet.


A Ceifa
1884 (?), óleo sobre madeira
37,5 x 56 cm
Casa Museu Anastácio Gonçalves
Lisboa, Portugal

Foi exactamente em 1870 que António Carvalho da Silva Porto (Porto, 1859-1893) chegou à capital francesa para estudar pintura. Desde logo influenciado pelo realismo, começou a pintar ao livre embrenhando-se nas florestas e bosques. Findada a aprendizagem e depois de uma passagem por Itália, onde aproveitou para acentuar o seu interesse pelos motivos folclóricos e os ciclos da natureza, regressaria ao Porto em 1879.

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