O Sapo também habita num verso de Poema

Maria Júdice Borralho
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A poesia é mais que uma meditação delicada e a ciência não é a única via que orienta o modo de conviver com o mundo natural. Poesia e Ciência nasceram do mito porém, a Ciência não sabe lidar com o “sagrado”. Se os conhecimentos científicos existentes sobre o Sapo são insubstituíveis, a literatura que o menciona pode dar um bom contributo para o modo de pensá-lo e aceitá-lo, o que é importante para a sua conservação. Virgínia Woolf, Teixeira de Pascoaes, Rui Belo e Breton são escritores, entre muitos outros, que incluíram o curioso anfíbio na obra que escreveram. Ou buscando a luz do Sol, ou saboreando uma chuvada, ora saltando, ora cantando, ou ainda envolvido nos trabalhos da conservação da sua espécie na Terra, cada autor, lembra que há um animal chamado Sapo, que anda pelos campos, assoberbado, empenhado na difícil tarefa de viver. Eis como ele entra na literatura:

 Virgínia Woolf, escreveu aquele que talvez seja o seu melhor romance, AS ONDAS. Marguerite Yourcenar, sua tradutora francesa, classifica-o de “narrativa musical”e, compara os monólogos interiores à Arte da Fuga de Bach. Ora, curiosamente, o Sapo ocupa no romance, um singelo espaço, embora não seja como cantor. A romancista inglesa atenta aos sons, a certa altura escreve: Ouve! É o salto de um enorme sapo na vegetação rasteira; algumas dezenas de páginas passam, e o simpático animal volta à cena: semelhante a um sapo no seu buraco, acolho os acontecimentos com perfeita frieza.

Teixeira de Pascoaes, é um observador atento da Natureza. Certa noite, entre os gemidos do vento e tristes pensamentos, o canto de um Sapo fez a diferença: Nos pinheirais o vento geme e chora / E os sapos cantam / E ouço a noite a chorar no meu jardim.

Rui Belo, melancolicamente, inventa caminhos no labirinto do tempo. No poema INVOCAÇÃO entre solidão, sombras e gente que não sente qualquer necessidade de saber, há a esperança de que perto ande pelo ar o perfume da flor do castanheiro e há também um alegre Sapo. Nunca aspirei a mais do que ao repouso / nas regiões onde em fins de Janeiro /já o inverno lentamente se despede / e o sapo satisfeito pela chuva /oculta a cabeleira de uma nuvem …

André Breton, revolve a substância poética. Na poesia surrealista, fluxo de um pensamento que gera lances imprevistos, poderá o absurdo tornar-se racional? Por que não há-de a linguagem perseguir algo, mesmo que acabe por cair no vazio? No poema FATA MORGANA o Sapo de Breton desempenha estranha missão: Uf o lagarto passou sem me ver / (…) E o ovo religioso do galo / Continua a ser religiosamente chocado pelo sapo / Da velha varanda segura apenas por um fio d´hera /Acontece o olhar errante sobre as adormecidas águas …

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