Entrevista a Luis Manuel Gaspar

João Bugalho
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Não sei se a natureza existirá hoje, algures, em estado puro. O importante é que durante tantos anos o fogo e água, os animais, o vento e as mãos de muita gente conseguiram criar na terra uma espécie de silêncio densamente povoado, de que podemos ainda participar e onde se reconhece talvez, com um ritmo diferente no bater do coração, uma das faces da beleza. A paisagem natural, assim aperfeiçoada pelos séculos, resiste em alguns santuários do nosso dia a dia tão abalado. Pintar a natureza hoje? É tentar reflectir o que foi a imagem da eternidade humana e resiste agora quase clandestina - mas ainda beleza à mercê de olhos limpos.

-De entre os poetas que mais admira, cite-nos dois ou três em cuja obra a natureza tenha uma importância marcante.

Por exemplo, Aquilino Ribeiro, que não escreveu versos mas falou como ninguém da "moinha dos centeios padejados" e do "rescendor da macela e da labaça"; o nómada Ruy Cinatti (E os seus olhos fatigados sossegaram/ À sombra da floresta mergulharam / Na lagoa das águas em silêncio ...) e Francisco Bugalho à beira do tanque na "Tarde Quente" ouvindo o mesmo silêncio; Raul Brandão e António Osório, vendo voltar, cada ano, as andorinhas.

- Sei que sabe de memória muitos dos poemas de que mais gosta: cite-nos um em que o campo ou os animais sejam tema central.

Do livro "De Fevereiro a Fevereiro", de Gil de Carvalho:

E por Novembro
A galinhola toma-se da luz,
Já pouca, e levanta na bruma
De um pinhal
Coberto
Das montanhas ao mar.

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