Estuários dos rios Coura e Minho: Biodiversidade ameaçada

Hugo Costa
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No Noroeste de Portugal localizam-se os estuários dos rios Minho e Coura que, em conjunto, constituem uma zona húmida de elevado valor ecológico, possuindo 4 diferentes estatutos de protecção. É uma área, porém, sujeita a diversas ameaças.

As zonas húmidas são, por definição, todas as áreas continentais que se encontram cobertas por água, ou seja, rios, ribeiras, pântanos, lagoas, pauis, rias e estuários. Estes últimos caracterizam-se por possuírem água salobra, que resulta da mistura da água doce proveniente dos rios com a água salgada do mar, e são normalmente locais de grande importância a nível biológico, uma vez que possuem uma grande diversidade florística e faunística (Guedes e Costa 1994).

No extremo Noroeste de Portugal localizam-se os estuários dos rios Minho e Coura que, em conjunto, constituem uma zona húmida de elevado valor ecológico e de inegável importância a nível nacional, possuindo 4 diferentes estatutos de protecção: Sítio da Rede Natura 2000, Zona de Protecção Especial para as Aves (ZPE), Important Bird Area (IBA – estatuto concedido pela Birdlife International, uma organização internacional que se dedica ao estudo e conservação das aves) e ainda Biótopo CORINE.

A junção do rio Coura ao Minho, pouco antes deste último desaguar no Oceano Atlântico, juntamente com as características climáticas da região e a acção do Homem, permitiu a ocorrência de uma grande diversidade de habitats numa área relativamente pequena.

 

Sapais, bancos de areia, juncais, uma enorme mancha de caniçal, galerias ripícolas extremamente bem preservadas (que por vezes formam bosques mistos) de amieiro (Alnus glutinosa), salgueiro (Salix sp.), freixo (Fraxinus angustifolia) e sanguinho-de-água (Frangula alnus), carvalhais (Quercus robur), manchas de pinheiro-bravo (Pinus pinaster) de grande porte e campos agrícolas, permitem a ocorrência de um número bastante elevado de espécies faunísticas, algumas delas muito importantes do ponto de vista conservacionista.

O lagarto-de-água (Lacerta schreiberi), a rã-ibérica (Rana iberica), o discoglosso-ibérico (Discoglossus galganoi) e a lontra (Lutra lutra) são comuns neste magnífico local. É ainda de salientar a ocorrência de visão-americano (Mustela vison), uma espécie oriunda da América do Norte e introduzida acidentalmete na região por fuga de quintas de criação em Espanha. Ao que parece a espécie é bastante abundante, desconhecendo-se totalmente o seu impacto na fauna autóctone da região.

A importância desta zona a nível nacional é totalmente comprovada quando se analiza o grupo das aves. Nidifica aqui pelo menos um terço das mais de 150 espécies com ocorrência confirmada no local, algumas delas de distribuição localizada em Portugal, como a garça-vermelha (Ardea purpurea), a felosa-unicolor (Locustella luscinioides) e o dom-fafe (Pyrrhula pyrrhula).

Desde o final do Verão até meados da Primavera, o extenso caniçal e as zonas de vasa são utilizadas por muitas espécies de aves aquáticas, especialmente patos e limícolas. A região é, não só local de passagem de milhares de indivíduos durante a época de migração (segundo Farinha e Trindade (1994) ocorrem aqui cerca de 20 espécies cuja ocorrência em Portugal é acidental, rara ou pouco comum), como também uma importante fonte de alimento e refúgio para aves que aqui passam o Inverno.

 
 
 


 
No entanto, esta zona enfrenta um elevado número de problemas de natureza bastante diversa e cuja responsabilidade se divide por portugueses e espanhóis. As inúmeras mini-hídricas construídas por estes últimos ao longo do Rio Minho para aproveitamento hidroeléctrico, impedem o ciclo de vida de espécies aquáticas migradoras extremamente ameaçadas, como é o caso do salmão (Salmo salar).

O lado espanhol é também o grande responsável pela degradação da qualidade da água do rio Minho, uma vez que não possui um sistema eficiente de tratamento dos efluentes provenientes das diversas indústrias existentes ao longo do curso deste rio.

Por seu lado, os portugueses são responsáveis por uma acção que alterou drasticamente a dinâmica natural do estuário do Minho. Procederam à escavação de um corredor para a travessia do “ferry-boat” que liga Caminha a La Guardia, o que resultou no assoreamento da sua foz, com graves problemas para os pescadores que, na sua faina diária, têm que alcançar o mar.

 
 
 

Esta zona encontra-se também ameaçada por uma infraestrutura rodoviária. A diversidade biológica do rio Coura pode ser extremamente afectada pelo prolongamento do IC1, que liga Riba de Âncora a Caminha, caso o atravessamento deste curso de água se verificar demasiado a jusante.

Por último, é ainda de referir que, apesar dos estatutos de protecção desta área e das espécies que nela ocorrem, são cometidos, durante a época de caça, verdadeiros crimes pelos caçadores menos escrupulosos. Garça-cinzenta (Ardea cinerea), garça-branca (Egretta garzetta), pássaro-bique-bique (Tringa ochropus), guarda-rios (Alcedo atthis), gaivotas (Larus sp.), águia-de-asa-redonda (Buteo buteo), gavião da Europa (Accipiter nisus) e ógea (Falco subbuteo) são algumas das espécies a que pertencem aves mortas por caçadores nas épocas de 1999/00 e 2000/01. Foi inclusivé testemunhado caçadores dispararem contra bandos de andorinhas.

É portanto crucial que, o mais depressa possível, se tomem medidas para evitar este tipo de atentados, por forma a, pelo menos, preservar o que ainda existe. Para tal, é urgente a elaboração de um plano de ordenamento e de gestão dos Sítios da Rede Natura 2000, e que este possa ser posto em prática enquanto ainda é tempo.

Bibliografia

Farinha, J.C. e Trindade A. (1994). Contribuição para o Inventário e Caracterização de Zonas Húmidas em Portugal Continental. Publicação MedWet/ICN.

Guedes, R.L. e Costa, L. (1994). As aves em Portugal. Edições INAPA, Lisboa.
 


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