Tartaruga-comum: a mascote cabo-verdiana, uma espécie ameaçada

Filipa Serra Gaspar
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As maiores ameaças

As ilhas de Boavista e Sal são as que registam maior número de tartarugas. No entanto, é também nestas ilhas que o turismo de massas tem crescido a um ritmo acelerado. A construção de resorts é uma ameaça para a espécie e preocupa todas as camadas de activistas cabo-verdianos, seja pelas luzes fortes que emitem ou pelos ruídos emitidos que podem alterar o processo normal de desova. “Agora estamos a trabalhar para mitigar os impactos, tentar colocar uma iluminação mais amiga do ambiente e das tartarugas, tanto nos hotéis como também em habitações”, afirma Sónia Araújo. “É também necessário despertar a mente das pessoas. Precisamos de mostrar que não é apenas uma legislação. A população no geral não conhece os motivos pelos quais a espécie é protegida”, esclarece. Para combater essa realidade, são diversas as campanhas que decorrem ao longo de todo o arquipélago.

Nos mercados, na rua, toda a população nega o consumo: “Comer tartarugas? Isso era dantes. Agora não, nem pensar. Em Cabo Verde não se come tartaruga”. No entanto, José Tavares, membro da associação Turtle Foundation, revela o outro lado da moeda: “Há técnicas muito sofisticadas de apanha. As pessoas conseguem camuflar tudo muito bem. Desenvolveram-se canais sofisticados para comercializar a carne. Eles têm pessoas identificadas e conseguem colocar a carne em bancos, empresas, têm clientes e conseguem inclusive fazer entrega ao domicílio. É um negócio muito bem organizado”, explica.

Fig. 2 - Comercialização de peixe no Mercado do Plateau, no centro da cidade de Praia

Quando vêm a terra fazer a desova, as tartarugas são uma presa fácil. São animais de locomoção lenta, que depois de virados ao contrário não têm escapatória. No entanto, toda a gente sabe que é proibido apanhar tartarugas, garante Sónia Araújo: “Apesar de não ser considerado crime, as pessoas tentam esconder-se ao máximo para não serem apanhadas em flagrante. Se isso acontecer é apreendido todo o material, são levados até à polícia, enfim… Ninguém quer passar por esse constrangimento”.

Assim, surge um novo problema: “Começaram a matar as tartarugas no mar. Só desembarcam com a carne disfarçada e deitam a carapaça fora. É mais discreto e menos arriscado”, declara Emanuel Charles d’Oliveira, ou Monaya, como é conhecido. “Como eu mergulho, de vez em quando, encontro carapaças de tartarugas em alto mar. No entanto, cada vez encontro menos, o que não impede que a prática continue a ocorrer noutros sítios”, confessa. Ex-activista no campo das tartarugas, esteve envolvido em trabalhos de protecção da espécie por volta de 2005, com a associação Natura 2000. Iniciou um trabalho pioneiro na protecção da espécie na Ilha de Santiago, que embora seja uma das ilhas que tem uma menor afluência do animal, é onde mais se consome, pois é onde se concentra a maioria dos cabo-verdianos.

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