Dunas – O que são, como se formam, qual o seu valor e sensibilidade?

Jorge Cancela - Biodesign
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Em situações de litoral agressivo e de subida do nível médio do mar, a preservação das dunas ganha uma dimensão estratégica na defesa de pessoas e de bens, e uma dimensão ecológica na defesa de sistemas sensíveis às alterações provocadas pelo Homem.

1. O que é uma duna?

Muito simplesmente, uma duna, também chamada em português “medão” ou “medo”, é uma elevação (ou “monte”) de areia, com as formas características que a sua relação dinâmica com o vento lhe confere.

As dunas podem ser móveis (as mais comuns se houver contínua acção do vento), fixas (por exemplo se estabilizadas por vegetação) ou fósseis (consolidadas e formadas em época geológica antiga).

As dunas formam-se com quatro componentes. Areia seca, vento, uma superfície de deposição e um pequeno obstáculo (como uma pedra ou uma planta).

O pequeno obstáculo é indispensável para criar condições de adesão a barlavento (donde o vento entra) e de protecção a sotavento (donde o vento sai), permitindo assim que a areia transportada pelo vento comece a juntar-se, criando um "montinho".

Com a continuação do processo esta pequena acumulação de areia começa ela própria a tornar-se um obstáculo, pelo que, se continuar a haver vento na mesma direcção e areia suficiente, a continuação do processo criará uma duna.


À medida que a duna cresce, começa também uma migração da mesma para sotavento, provocada pelos movimentos dos grãos de areia empurrados pelo vento da face exposta, caindo depois para a face protegida. É por isso que elas têm ângulos diferentes, mais suave na face a barlavento, mais inclinada a sotavento.

Existem vários tipos de dunas, mas todas têm estes princípios de formação e evolução. Normalmente as dunas junto ao mar, dada a direcção mais ou menos constante do vento, formam zonas de dunas transversas, quer dizer compridas e transversais ao sentido do vento, paralelas entre si.


 

As dunas formam-se, como visto atrás, essencialmente onde houver areia e vento, ou seja, junto a zonas litorais e nas zonas interiores, nos desertos. Em Portugal existem apenas dunas com extensão considerável na zona litoral, como é o caso das dunas da Costa da Caparica.


2. O que são e como se formam os sistemas dunares?

Os sistemas dunares são conjuntos de dunas organizados principalmente de acordo com as condições de vento de um dado local e, visto que estas raramente aparecem isoladas, constituem a forma mais comum de ocorrência das dunas.

Nas zonas litorais, o sistema dunar forma-se com o aparecimento de uma acumulação de areia, de acordo com o descrito no ponto 3., na zona mais próxima à água, mas fora da zona de rebentação. Esta duna vai aumentando e movimentando-se no sentido do vento - em Portugal normalmente do litoral para o interior - da forma referida.

O afastamento assim feito da zona mais próxima ao mar, pode deixar espaço para aparecimento de outras acumulações de areia nesse mesmo local, que começam a “bloquear” o vento que empurra a duna inicial. Esta diminuição do vento pode criar as condições para que uma duna inicial, mais afastada agora do mar, comece a estabilizar e a ser recoberta com vegetação, fixando-se.

Este processo pode ir acontecendo até que todo um sistema dunar esteja fixo, quer por razões naturais, quer por intervenção humana através de plantações de espécies vegetais fixadoras (o que aconteceu nas dunas da Costa da Caparica durante o século XX).


Dada a fixação das dunas mais em terra, a duna mais junto ao mar adquire o seu perfil de equilíbrio, que embora variando ao longo do ano face à proximidade da rebentação e como tal à disponibilidade de areia na praia, mantêm-se também mais ou menos constante num dado local e permitindo assim o início da sua fixação pelas plantas.

Neste sistema dunar assim criado, à duna mais próxima ao mar chama-se “duna primária”, à duna seguinte “duna secundária” e à zona entre elas “espaço inter-dunar”.

Os sistemas dunares podem ser muito complexos e extensos, como é o caso da Costa da Caparica onde o mesmo se desenvolve desde o mar até ao topo da arriba fóssil, numa extensão que chega a ser de quase 1,5 quilómetros e que ronda em média cerca de 1 quilómetro. Este sistema dunar tem (ou teve quando todo existia) um comprimento de cerca 13 quilómetros, desde a Cova do Vapor até à Mina do Ouro, a sul da Fonte da Telha.


3. Como deve ser ordenado um sistema dunar?

Com os conhecimentos anteriores sobre a criação das dunas, da sua relação dinâmica com o vento e a fragilidade das plantas estabelecidas dadas as difíceis condições de sobrevivência das mesmas nas dunas, podemos estruturar o uso potencial dos sistemas dunares fixos da seguinte forma:

• Praia – tolerante ao recreio
• Duna primária – muito sensível; intolerante ao recreio, à construção e as passagens só podem ser pedonais e se intensas sobrelevadas
• Espaço interdunar – sensível, mas tolerante a certos usos recreativos e instalação de construções leves
• Duna secundária – muito sensível; intolerante ao recreio, à construção e as passagens só podem ser pedonais e se intensas sobrelevadas
• Zona pós-dunar – tolerante ao recreio e construção, tendo em conta as capacidades de carga, níveis freáticos e outros parâmetros biofísicos.

Esta é a distribuição natural das ocupações em função do valor e sensibilidade do sistema dunar. Qualquer outra situação implica sempre impactes significativos ao nível da utilização do património colectivo que esses sistemas constituem.

São por isso sempre indicados esquemas de ordenamento que afastem edificações das dunas, como é o caso da Carta Europeia do Litoral, Decreto-Lei nº 302/90 de 26 de Setembro (princípios a que deve obedecer a ocupação, uso e transformação da faixa costeira) e dos modelos de ocupação do território, de que aqui se transpõe um exemplo.

 

 

É preciso não esquecer a importância cada vez maior que as dunas, principalmente as dunas primárias, têm como “tampão natural” à violência das ondas, criando com elas um equilíbrio dinâmico – recebendo, armazenando e largando areia - que protege os usos do solo a sotavento e que implica sempre a sua conservação, bem como da duna secundária associada.

Sem este sistema e em situações de litoral “agressivo” e níveis de subida médios do mar inquestionáveis, a preservação das dunas ganha dimensões tanto estratégicas na defesa de pessoas e bens como ecológicas de defesa de um sistema sensível ás alterações que o Homem faz.

4. Como é que os sistemas dunares são destruídos?

As dunas são sistemas instáveis, mesmo quando estabilizadas pela vegetação, pois essa estabilização constitui um “fio-de-navalha”, que qualquer perturbação altera.

Por exemplo, quando a vegetação é continuamente pisada a ponto de desaparecer, a areia solta não oferece resistência e o vento é rápido a explorar um caminho preferencial, que inicia um chamado “blow-out” ou “duna em ferradura”, que avança rapidamente e que em casos extremos pode por em risco todo o sistema dunar e os usos a ele associados.

Se o simples pisoteio pode ter estas consequências, o que dizer da instalação artificial permanente? A destruição total da vegetação em grandes áreas transforma uma duna fixa numa duna móvel, sendo assim os processos de novo dominados pela presença da areia e do vento e da relação entre eles e as estruturas ocorrentes na duna. O desfecho deste encontro de factores traduz-se quase sempre na destruição da duna e/ ou da estrutura artificial (por exemplo, por ficar enterrada na areia), com riscos de recuo da linha de costa significativos.

 


5. Como é que os sistemas dunares podem ser recuperados?

Essencialmente nas dunas mais próximas ao mar, por repor estruturas de vegetação pioneira como o estorno associadas a linhas de canas enterradas, que constituem os “obstáculos” à volta dos quais a duna se começa a criar (acção das canas) e a fixar (acção das plantas).

Este processo de recuperação pode ser lento e obriga a uma acção de gestão e manutenção constante.

A recuperação implica também naturalmente a retirada das estruturas construídas que provocam a destruição da duna, bem como o controlo dos acessos, que deverá ser feito por estruturas aéreas, apenas com apoios pontuais na duna (passadiços sobrelevados em madeira, por exemplo).

6. Bibliografia

BTCV (1999). Sand dunes. A pratical handbook. British Trust for Conservation Volunteers. Wallingford.

Carter, R.W.G. (1991). Coastal Environments. An Introduction to the Physical, Ecological and Cultural Systems of Coastlines. Academic Press. London

McHarg, I. (1992). Design with nature. John Wiley and Sons. New York.



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