Cegonha-preta, a parente tímida

Teresa Catry
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Contrariamente à Cegonha-branca, sua parente mais próxima, a Cegonha-preta é rara no nosso País e não vive em harmonia com o Homem, sendo precisamente a actividade humana e a consequente perda de habitat a principal ameaça à sua sobrevivência.

  

IDENTIFICAÇÃO E CARACTERÍSTICAS

A Cegonha-preta (Ciconia nigra) pertence à ordem dos Ciconiformes. Não é comum como a bem conhecida Cegonha-branca (Ciconia ciconia) e, uma vez que é uma espécie tímida, a sua observação pode tornar-se difícil. É um pouco mais pequena que a Cegonha-branca, medindo cerca de 97 cm de comprimento e aproximadamente 190 cm de envergadura. A plumagem é negra na cabeça, pescoço, dorso e asas, possuindo um brilho metálico verde-dourado, púrpura e vermelho cobre em determinadas condições de luminosidade. A barriga é branca; as patas e o bico são vermelhos. A fêmea possui uma tonalidade ligeiramente mais mate e é um pouco mais pequena que o macho. As aves jovens não possuem brilho na plumagem que é negra-acinzentada e o bico e as patas são esverdeadas. É habitual observar esta espécie pousada em postes eléctricos, árvores altas e escarpas.

DISTRIBUIÇÃO E ABUNDÂNCIA

Nidifica em toda a Eurásia e no Sul de África, com praticamente metade da sua área de distribuição localizada na Europa, onde é uma espécie rara e dispersa. Actualmente as principais populações reprodutoras estão concentradas na Polónia, Rússia e Turquia. Na Europa Ocidental e Central esta espécie sofreu um declínio na segunda metade do século XIX e chegou mesmo a extinguir-se na Bélgica, Dinamarca e Suécia. Desde então as populações têm vindo a recuperar lentamente na Europa Central, nomeadamente em França e na Alemanha e também em Espanha. No entanto continuam a diminuir em Portugal, na Lituânia, Croácia, Albânia e Grécia. A população europeia está estimada em 6.500 a 19.000 casais reprodutores.

Em Portugal esta espécie nidifica no interior do país, principalmente junto aos rios Douro, Tejo e Guadiana. A população portuguesa está estimada entre 30 a 50 casais.


ESTATUTO DE CONSERVAÇÃO

Em consequência do declínio sofrido nas populações e na área de distribuição, a Cegonha-preta está incluída nas SPECs (Species of European Conservation Concern) na categoria SPEC3 que inclui as aves com estatuto de conservação desfavorável. Em Portugal está classificada como ameaçada. Inclui-se ainda nas Convenções de Cites, Bona (Anexo II), Berna (Anexo II) e na Directiva Aves (Anexo I).


FACTORES DE AMEAÇA

A destruição e degradação das florestas constitui a principal ameaça à sobrevivência desta espécie. Na Rússia o rápido desenvolvimento da agricultura e da indústria e sobre-exploração das florestas provocaram uma redução acentuada na disponibilidade do habitat da Cegonha-preta. Também a perturbação humana nas áreas de nidificação constitui um factor de ameaça, uma vez que é responsável pelo reduzido sucesso reprodutor. O abate ilegal de aves na migração, nomeadamente em África, a mortalidade devida a colisões com postes de alta tensão e a contaminação por pesticidas constituem outras ameaças não negligenciáveis.

HABITAT

A Cegonha-preta é uma ave territorial e cada casal necessita de uma extensa área que poderá ter entre 50 e 150 Km2. Tem preferência por florestas espontâneas de folha caduca e mistas, nas quais encontra ribeiros, rios, prados, zonas palustres e charcos ricos em alimento. No sul da área de distribuição reproduz-se também em regiões de penhascos, habitualmente fragas junto a rios, mas também em zonas de montado de azinho e sobro.


ALIMENTAÇÃO

Esta espécie alimenta-se em ribeiros de água límpida, charcos e prados húmidos. Captura principalmente peixes, anfíbios e insectos, mas também outros pequenos vertebrados, como ratos e aves jovens.

 

REPRODUÇÃO

A Cegonha-preta não nidifica colonialmente, mas por vezes é possível encontrar 2 ninhos na mesma árvore ou junto a ninhos de garças. Constrói o ninho com ramos, terra, musgo, papel, em árvores velhas e de grande porte ou em penhascos, a uma altura que varia entre 4 e 25 m. No seu território possui frequentemente vários ninhos que são utilizados alternadamente de ano para ano e que, com o tempo, ganham grandes dimensões. A postura é constituída por 2 a 5 ovos esbranquiçados, que são incubados durante um período aproximado de 35 dias. Os juvenis atingem a idade de emancipação entre os 63 e os 71 dias.


MOVIMENTOS

Esta espécie é migradora e dispersiva. Algumas aves da Península Ibérica e do Sul da Europa são residentes; no entanto, as restantes populações migram em Setembro ou Outubro para invernar na África sub-Sahariana. As populações do leste tendem a invernar na Índia e na China. As Cegonhas-pretas chegam às áreas de nidificação cerca de duas semanas mais tarde que as Cegonhas-brancas, em finais de Março e inícios de Abril. Na migração não se juntam às Cegonhas-brancas, mas antes a algumas espécies de abutres que utilizam as mesmas rotas migratórias.


CURIOSIDADES

Apesar de ser uma espécie caracteristicamente tímida e reservada, pontualmente, a Cegonha-preta tolera a presença humana. Na Transcaucásia habitou-se ao Homem: nidifica na periferia ou mesmo no centro das aldeias e pesca no tanque da aldeia ou no ribeiro do prado, enquanto os camponeses trabalham no campo.

 

LOCAIS FAVORÁVEIS DE OBSERVAÇÃO

Em Portugal esta espécie nidifica no interior, do Norte ao Sul do país, exibindo uma clara preferência pelas bacias hidrográficas dos rios Douro, Tejo e Guadiana, bem como por zonas onde a vegetação natural é dominada por Sobreiros (Quercus suber), Azinheiras (Quercus rotundifolia) e Oliveiras (Olea europea). É também possível observá-la na zona de Sagres na época da migração pós-nupcial, principalmente no mês de Outubro.

BIBLIOGRAFIA

Pacheco, C. e P. Monteiro (1999). Efectivo populacional de algumas aves rupícolas na área proposta para Parque Natural do Tejo Internacional. In Beja, P., P. Catry e F. Moreira (Eds.). I Congresso de Ornitologia da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves. SPEA. Vila Nova de Cerveira. Pp. 90-91.

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Snow, D.M. e C.M. Perrins (Eds.) (1998). The birds of the Western Palearctic. Concise Edition; vol. 1 Non passerines. Oxford University Press.

Tucker, G.M. e M.F. Heath (1994). Birds in Europe: Their Conservation Status. Birdlife Conservation Series nº 3.

 

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