Ficha do Gato-bravo

Hugo Costa
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O gato-bravo é um dos mais belos e interessantes carnívoros da nossa fauna. Maior e mais robusto do que o gato-doméstico, encontra-se particularmente ameaçado pela poluição genética que resulta da sua hibridação com este.

IDENTIFICAÇÃO E CARACTERÍSTICAS

O gato-bravo (Felis silvestris) é um carnívoro de médio porte pertencente à Família dos Felídeos e é mais robusto e de feições mais rudes que o gato doméstico. A sua pelagem densa apresenta uma coloração variável, podendo ser cinzenta, castanho clara ou, mais raramente, melânica (negra ou quase). Tem umas riscas negras características nos flancos e extremidades e, ao contrário do gato doméstico listado ou malhado, não tem pintas no corpo. A sua cauda é grossa, peluda e relativamente curta, com 3 a 5 anéis largos e negros, sendo a extremidade arredondada e também negra. A cabeça é arredondada e volumosa, com focinho curto e mandíbulas robustas. As orelhas são curtas e arredondadas, os olhos são grandes e geralmente verdes. As patas são curtas e estão dotadas de poderosa musculatura e grande flexibilidade.

O corpo varia entre os 52 e 65 cm de comprimento nos machos e entre 48.5 e 57 cm nas fêmeas. O comprimento da cauda varia entre 25 e 34.5 cm. Os machos pesam em média 5 Kg e as fêmeas 3.5 Kg, não ultrapassando os primeiros 7.7 Kg e as segundas 4.95 Kg. Têm variações sazonais no seu peso, que podem ser de 2.5 Kg nos machos e 2.15 kg nas fêmeas.


DISTRIBUIÇÃO E ABUNDÂNCIA

Actualmente, o gato-bravo encontra-se na Europa em regiões bem distintas: Pirinéus e Península Ibérica, Apeninos e Sul de Itália, uma região no centro da Europa que inclui o Nordeste da França, uma parte da Bélgica e outra da Alemanha, Norte da Escócia, as grandes ilhas mediterrânicas (Sicília, Sardenha, Córsega e Creta), Balcãs e Cárpatos, Ásia menor e Cáucaso.

Em Portugal existe tanto no Norte como no Sul, estando a sua presença confirmada em muitos Parques Naturais. No nosso país esta espécie parece ser pouco abundante e a sua tendência populacional é desconhecida.

ESTATUTO DE CONSERVAÇÃO

Em Portugal tem o estatuto de indeterminada (I), ou seja é uma espécie que se sabe estar ameaçada, mas para a qual a informação é insuficiente para identificar a categoria apropriada. Pertence ao Anexo II da convenção de Berna (espécie estritamente protegida), ao Anexo IIA da convenção de Washington (CITES) e está abrangida pelo Dec. Lei 311/87.


FACTORES DE AMEAÇA

A hibridação com o gato doméstico é considerada como um dos maiores factores de ameaça para esta espécie em grande parte dos países europeus. Outros factores de ameaça importantes são: a fragmentação das populações devido à construção de vias rodoviárias, ao desenvolvimento de culturas intensivas e à desflorestação; a destruição do habitat devido principalmente aos incêndios e ao recurso à silvicultura monoespecífica; o controlo de predadores e a escassez de informação biológica e ecológica existente sobre esta espécie no nosso país.


HABITAT

De um modo geral o seu habitat preferencial é o bosque caducifólio. No sul da Europa está principalmente associado a matagais mediterrânicos, florestas e bosques caducifólios ou mistos e, marginalmente, a florestas de coníferas. Estudos efectuados sobre a selecção do habitat, inclusivamente em Portugal, revelaram que o gato-bravo tem preferência por bosques associados às linhas de água assim como por pinhais, que parecem ser bons locais de repouso.

Durante o dia refugia-se em buracos de árvores, fendas nas rochas e em tocas abandonadas de texugo, raposa ou coelho. Durante os meses quentes de Verão pode permanecer ao ar livre, procurando o fresco e o refúgio que a floresta lhe oferece.


ALIMENTAÇÃO

O gato-bravo é um predador oligófago, dependendo a sua alimentação não de um espectro limitado de presas mas sim da região em que se encontra. A base da sua dieta é constituída por pequenos roedores. Consome também lagomorfos (lebre e coelho), aves e com menor frequência anfíbios e répteis. Esporadicamente pode consumir peixes e também insectos.

Confia nos seus reflexos e agilidade para surpreender as presas e prefere caçar em terrenos abertos do que em floresta densa. Um gato-bravo adulto consome em média 400 a 500 g de alimento por dia.

REPRODUÇÃO

Entra no cio entre Janeiro e Março, dependendo da localização geográfica, e os acasalamentos ocorrem no final do Inverno e na Primavera. Pensa-se que os machos mais competitivos copulam com várias fêmeas na mesma época reprodutora. Dois terços dos nascimentos verificam-se do meio de Março até ao final de Abril, sendo a gestação de 63 a 68 dias. Tem uma ninhada por ano, da qual em média nascem entre 3 e 4 crias. O aleitamento verifica-se até ás 6-7 semanas, mas as crias podem mamar esporadicamente até ao quarto mês. Nesta altura começam aos poucos a ganhar independência e passado pouco tempo procuram um novo território.

As fêmeas são sexualmente maturas entre os 9 e 10 meses e os machos com 1 ano de idade. Em liberdade pode viver até aos 11 anos.


MOVIMENTOS

É principalmente crepuscular e nocturno, tendo os olhos perfeitamente adaptados para ver na escuridão e um sentido de audição muito desenvolvido. É solitário, sendo feroz e intransigente frente a outros congéneres quando se trata de defender o seu território e só se mostra social no período nupcial. As fêmeas são mais territoriais e combativas, especialmente durante a época de criação. Os machos são nómadas e sobrepõem os seus movimentos ás áreas vitais de várias fêmeas. Durante a época de reprodução restringem-se a uma área vital na floresta. Os territórios de gato bravo variam entre 0.6 e 3.5 Km2, mas em Portugal, os estudos efectuados apontam para territórios maiores (entre 10 e 12 Km2).

CURIOSIDADES

Uma prova do apurado sentido de olfacto e excelente sentido de audição deste animal, é o caso de uma fêmea que estava a ser seguida por telemetria e que ficou cega durante um Inverno rigoroso devido à neve. Mesmo sem visão, conseguiu atravessar a maior parte do seu território e sobreviveu em condições razoáveis.


LOCAIS FAVORÁVEIS DE OBSERVAÇÃO

O gato-bravo é uma espécie dificilmente observável no seu habitat natural devido aos seus hábitos nocturnos. Fazem latrinas (locais onde acumulam os dejectos) em locais proeminentes do terreno e enquanto que no interior do território enterram os dejectos, na sua periferia deixam-nos a descoberto. Estes são reconhecíveis por serem bastante compactos, pela ausência de estrangulações e por um dos extremos terminar numa ponta muito fina. São constituídos por pequenos pedaços que medem entre 1.5 e 8 cm de comprimento e 1.8 a 3cm de diâmetro. Afiam as unhas em árvores e arbustos deixando nestes as marcas das garras. As suas pegadas são constituídas pelas marcas de 4 dedos (cujas garras não estão marcadas) e por uma almofada principal trilobada. São normalmente maiores que as de gato doméstico.

BIBLIOGRAFIA

Libois, R.M. (1991). Le chat sauvage Felis silvestris Schreber, 1777. Cahiers d'Ethologie, 11(1), 81-90.

Macdonald, D. W. e Barret, P. (1993). Mamíferos de Portugal e Europa. Guias FAPAS. Porto.

Mathias, M.L.; Santos-Reis; J. Palmeirim e M.G. Ramalhinho. (1998). Mamíferos de Portugal. Edições INAPA.

Sanz, B. (sem data). Huellas e rastros de los mamíferos ibéricos (Mamíferos semiurbanos). Libros Certeza.

Stahl, P. e Leger, F. (1992). Le Chat Sauvage d'Europe (Felis silvestris Schreber, 1777). Encyclopédie des carnivores de France, vol. 17, 49 pp.

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