A bem sucedida Gaivota-de-asa-escura

Inês Catry
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A Gaivota-de-asa-escura é muito abundante no nosso País durante o Inverno, quando as populações do Norte da Europa migram para Sul. Neste período pode ser mesmo considerada a ave marinha mais comum e de repartição mais ampla na nossa costa.

 

 

IDENTIFICAÇÃO E CARACTERÍSTICAS

Ligeiramente mais pequena que a Gaivota-de-patas-amarelas (Larus cachinnans), a Gaivota-de-asa-escura (Larus fuscus) distingue-se desta pela cor mais escura das partes superiores e pela cabeça mais arredondada. Na Europa existem três subespécies - L .f. graellsii, L f. fuscus e L .f. intermedius.

No nosso país, a subespécie mais comum é a L. f. graellsii, que em plumagem nupcial apresenta a cabeça e as partes inferiores brancas e o manto e dorso cinzento-escuro. As asas são igualmente cinzento-escuro, à excepção das primárias, de cor preta e com pequenas manchas brancas na extremidade. O bico é amarelo com a extremidade da mandíbula inferior de cor vermelha. Os olhos são amarelos e o anel orbital é vermelho. Em plumagem de Inverno apresenta estrias bem marcadas de cor acastanhada ao longo da cabeça, pescoço e peito.

Os juvenis e imaturos em plumagem de 1º Inverno são muito diferentes dos adultos. As coberturas são de cor escura orladas a claro e as primárias exteriores, secundárias e rectrizes são pretas-acastanhadas, com as primárias interiores mais claras. As partes inferiores são claras. Os juvenis de Gaivota-de-asa-escura são semelhantes aos de Gaivota-de-patas-amarelas, embora mais escuros. Até atingirem a plumagem de adulto, o padrão é semelhante mas vão tornando-se mais escuros com as partes inferiores mais brancas.

DISTRIBUIÇÃO E ABUNDÂNCIA

As áreas de reprodução desta espécie abrangem as latitudes médias e altas do Paleárctico Ocidental até Portugal continental, o limite Sul da sua actual área de criação. L. f. graellsii nidifica na Grã-Bretanha, Islândia, França, Espanha e Portugal; L. f. intermedius no Sul da Noruega, Dinamarca e Holanda; L. f. fuscus nidifica desde o Norte da Escandinávia até à Península de Kola (parte ocidental da ex-URSS). A população mundial destas três subespécies é aproximadamente de 205.000 casais e cerca de um terço reproduz-se em Inglaterra e na Irlanda. Tal como a Gaivota-de-patas-amarelas, com uma maior população e maior área de distribuição, a Gaivota-de-asa-escura tem vindo a aumentar em número e a expandir a sua área de distribuição desde o século passado. As populações que nidificam entre a Islândia, Escandinávia e França, migram para Sul para passar o Inverno em Portugal, Sudoeste de Espanha e Noroeste Africano, com algumas aves que migram até à Mauritânia, Senegal e Golfo da Guiné. As populações que nidificam na área Este da distribuição da espécie atingem o Mediterrâneo e o Mar Negro, o Mar Vermelho, o Golfo da Arábia, as costas Norte e Este do Índico e as áreas mais interiores no Leste de África.

 

Em Portugal, a Gaivota-de-asa-escura é, essencialmente uma espécie invernante, embora também surja como migrador de passagem e até como reprodutor. A primeira confirmação da nidificação desta espécie ocorreu na Ilha da Berlenga e data de 1978. O efectivo reprodutor nacional está estimado entre os 30 e os 50 casais distribuído por três núcleos: Ilha da Berlenga, Ilha do Pessegueiro e Ria Formosa. A ordem de grandeza do efectivo invernante no nosso país não é clara. O Estuário do Tejo constitui um dos principais núcleos de invernada da espécie podendo albergar mais de 30.000 indivíduos. É pouco comum nos Açores, Madeira e Selvagens.


ESTATUTO DE CONSERVAÇÃO

A Gaivota-de-asa-escura é uma espécie não ameaçada (NT) no nosso país.

FACTORES DE AMEAÇA

No último século, esta espécie tem conhecido um aumento significativo, quer no efectivo populacional, quer no que respeita à sua área de distribuição. O aumento verificado é, em parte, desconhecido, embora esta espécie poderá ter vindo a beneficiar, tal como a Gaivota-de-patas-amarelas, do incremento de fontes alimentares relacionadas com a indústria pesqueira e o aumento do número de lixeiras. Tal como foi referido no tópico anterior, esta espécie não está ameaçada e apenas o desaparecimento de fontes alimentares poderá conduzir ao decréscimo do seu efectivo.


HABITAT

Encontra-se maioritariamente associada a extensões de água salobra, embora possa ser encontrada a muitos quilómetros da costa. Estuários, orla costeira, pisciculturas, salinas, lagoas costeiras, cursos de água, barragens, açudes, estações de tratamento de águas residuais, terrenos alagados, lixeiras e zonas urbanas.

ALIMENTAÇÃO

É uma espécie omnívora. A dieta é semelhante à da Gaivota-de-patas-amarelas. Inclui peixe, crustáceos, invertebrados aquáticos, crias e ovos de aves, material vegetal, roedores e desperdícios.

Alimenta-se com frequência em lixeiras, terrenos lavrados e arrozais. O alimento é obtido caminhando no solo, em água pouco profunda ou em zonas vasosas. Pode também capturar pequenas presas à superfície da água enquanto nada ou voando rente à água ou mesmo mergulhando. As gaivotas desta espécie recorrem muitas vezes ao cleptoparasitismo, roubando o alimento obtido por indivíduos da mesma espécie ou de outras espécies.


REPRODUÇÃO

É uma espécie colonial, embora possa também encontrada isoladamente ou em colónias de outras espécies de gaivota, como a Gaivota-argêntia (Larus argentatus) ou a Gaivota-de-patas-amarelas. Dentro da colónia são, no entanto, territoriais. As aves que se reproduzem mais a Sul começam a ocupar os seus territórios em finais de Fevereiro, embora a maioria o faça em Março. As colónias encontram-se junto à costa ou em ilhas, em dunas, terrenos planos com pouca vegetação, margens de lagos, zonas pantanosas e falésias rochosas. O ninho é instalado no chão e construído com algas, ervas ou outro tipo de material. Fazem uma única postura, de 3 ovos, entre finais de Abril e Maio, e os ovos eclodem após 24 a 27 dias. A emancipação das crias ocorre cerca de 30 a 40 dias após a eclosão.

MOVIMENTOS

É essencialmente migratória, embora nos últimos anos se tenham detectado aves residentes entre indivíduos de 2º Inverno e aves mais velhas. A área total de invernada estende-se desde a Grã-Bretanha, Mediterrâneo, Mar Cáspio e Negro e Golfo Pérsico, até ao Mar Arábico e África Ocidental e de Leste. L. f. graellsii inicia a migração pós-nupcial em Agosto, com grande parte das aves observadas neste mês e em Setembro a realizaram a migração rumo aos locais de invernada mais a Sul, ao longo da costa Ocidental africana.


CURIOSIDADES

Na ilha da Berlenga, onde criam alguns casais de Gaivota-de-asa-escura, foram já encontrados casais mistos desta espécie com Gaivota-de-patas-amarelas.


LOCAIS FAVORÁVEIS À OBSERVAÇÃO

Em Portugal, a Gaivota-de-asa-escura é essencialmente uma espécie invernante, facilmente observável ao longo de costa litoral, em estuários, praias, portos piscatórios e lixeiras. Menos comum que no litoral, pode ser observada, no interior, junto a barragens e açudes de grandes dimensões. Durante a Primavera e o Verão é mais rara, e a grande maioria das observações dizem respeito a indivíduos imaturos. Pode ainda ser observada nos locais de nidificação, embora em pequeno número: Ilha da Berlenga, Ilha de Porto Côvo e Ria Formosa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Elias, G. L., Reino, L. M., Silva, T., Tomé, R. e P. Geraldes (Coods.) (1998). Atlas das Aves Invernantes do Baixo Alentejo. Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, Lisboa.

Farinha, J. C. e H. Costa (1999). Guia de Campo das Aves aquáticas de Portugal. Instituto da Conservação da Natureza, Lisboa.

Lloyd, C., Tasker M. L. e K. Partridge (1981). The status of seabirds in Britain and Ireland. T and A.D. Poyser. London.

Projecto, J. e M. Lecoq (1998). Aves da Costa Alentejana. Direcção Regional do Ambiente-Alentejo.

Sauer, F. (1983). Aves Aquáticas. Editorial Publica.

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