Ficha do Licranço

Rui Braz e Maria João Cruz
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Verdadeiro lagarto sem patas, o licranço é um dos répteis mais interessantes e inesperados da nossa fauna. Susceptível de ser confundido com uma cobra por um leigo, é uma espécie inofensiva que se alimenta sobretudo de invertebrados.

 

 

IDENTIFICAÇÃO E CARACTERÍSTICAS

O licranço (Anguis fragilis), também conhecido por cobra-de-vidro, é um sáurio (lagarto) sem membros, de aspecto serpentiforme, com corpo muito alongado e cilíndrico. A cabeça é curta e a cauda encontra-se pouco diferenciada do corpo. Geralmente alcança 20 a 22 cm de comprimento total e pesa entre 8 e 40 gramas.

Os exemplares desta espécie possuem escamas muito lisas e brilhantes o que os torna inconfundíveis. O dorso é creme, pardo ou castanho e os flancos são da mesma cor ou mais escuros do que o dorso. Por vezes, apresentam uma linha vertebral mais escura. O ventre é acinzentado ou preto. Os juvenis possuem o dorso esbranquiçado, avermelhado ou prateado, onde se destaca uma linha vertebral escura.

Os machos são relativamente mais robustos do que as fêmeas e possuem uma cabeça consideravelmente maior e mais diferenciada do resto do corpo.

DISTRIBUIÇÃO E ABUNDÂNCIA

Esta espécie apresenta uma distribuição ampla por toda a Europa, com excepção da Escandinávia, Irlanda e ilhas mediterrâneas. Na Península Ibérica, encontra-se a norte dos rios Tejo e Ebro.

São muito comuns nas zonas húmidas do norte peninsular, mas mais escassos na zona central e no limite meridional da sua distribuição, onde as suas populações se encontram ameaçadas.


ESTATUTO DE CONSERVAÇÃO

Esta espécie faz parte do Anexo III da Convenção de Berna. Em Portugal o seu estatuto é não ameaçado (NT).

 

FACTORES DE AMEAÇA

A utilização de pesticidas e a alteração do habitat são consideradas as principais ameaças sobre esta espécie. Também sofre uma elevada taxa de mortalidade por atropelamento.


HABITAT

Aparece tanto ao nível do mar como em regiões de montanha, até aos 2400 m. Encontra-se principalmente em zonas que mantenham alguma humidade, em clareiras e orlas de bosques, pinhais, prados ou hortas. Evita ambientes muito expostos e secos assim como áreas permanentemente encharcados.


ALIMENTAÇÃO

A sua dieta inclui principalmente caracóis, lesmas, minhocas, aranhas, insectos e outros artrópodes. Ocasionalmente os adultos podem predar vertebrados como lagartixas, pequenas cobras e urodelos (anfíbios com cauda) e mesmo juvenis da sua espécie.

INIMIGOS NATURAIS

Entre os seus inimigos naturais incluem-se cobras (principalmente víboras e cobras lisas), o sardão, várias aves (corujas, mochos, milhafres, cegonhas, garças e tordos) e mamíferos (texugo, lontra, geneta, fuínha, raposa, ouriço e javali).


ACTIVIDADE

O período de hibernação pode iniciar-se em Outubro ou Novembro e durar até Março ou Abril. O licranço possui hábitos essencialmente crepusculares ou nocturnos e durante o dia mantém-se em esconderijos húmidos, debaixo de musgo, troncos em decomposição ou pedras. Porém, com tempo húmido e temperado, podem observar-se exemplares activos durante o dia, ao início da manhã ou ao fim da tarde. Tendo uma tolerância ao frio excepcional entre os répteis, pode manter-se activa até aos 12º C, mas nunca a temperaturas inferiores.

 

REPRODUÇÃO

O período de reprodução começa pouco tempo depois do fim da hibernação e durante o mesmo podem ocorrer brigas entre machos à base de dentadas. Nos preâmbulos da cópula, o macho mordisca a fêmea na parte anterior do corpo. Por fim, prende-a pela cabeça com as mandíbulas e dá-se a cópula.

Os licranços são ovovivíparos. A gestação dura 11 a 13 semanas e os partos dão-se geralmente entre Agosto e Outubro. As fêmeas podem ter 6 a 22 crias. A maturidade sexual é atingida aos 3 anos no caso dos machos, e apenas aos 4 ou 5 nas fêmeas. No entanto, as fêmeas sexualmente maturas não se reproduzem todos os anos. Esta espécie tem uma grande longevidade, podendo sobreviver em cativeiro até aos 54 anos.


CURIOSIDADES

Embora não possuam membros, nem mesmo de forma vestigial no esqueleto, sabemos que descendem de sáurios porque os seus embriões apresentam uns rudimentos dessas extremidades.
Trata-se de uma espécie totalmente inofensiva, cuja principal defesa se baseia na autotomia da cauda (capacidade de soltar a cauda quando se sentem ameaçadas, após o que a cauda volta a crescer, regenerando-se).

BIBLIOGRAFIA

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Diesener, G. and Reichholf. (1992). Reptiles y Anfibios. Blume, Barcelona.

Rosa, H. D. and E. G. Crespo. (1998). La conservación de los anfibios y reptiles en Portugal. Páginas 517 a 529 em Distribución y biogeografia de los anfibios y reptiles en España y Portugal, edited by Pleguezuelos, J.M.Granada:Monográfica Tierras del Sur, Univ. de Granada, Asociación Herpetológica Española.

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