Galerias Ribeirinhas Mediterrânicas – Oásis Lineares

Francisca Aguiar – Instituto Superior de Agronomia
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A vegetação ribeirinha de rios mediterrânicos estrutura-se em faixas de largura reduzida, com uma identidade muito distinta das áreas envolventes. Conheça estes `oásis lineares´, com grande importância na funcionalidade dos ecossistemas fluviais.

As galerias ribeirinhas – identidade, estrutura e composição

Um dos elementos que mais se destacam na paisagem mediterrânica é a rede de sistemas fluviais, distinguida por um gradiente cromático abrupto entre o verde das galerias ribeirinhas e os matos e montados das áreas envolventes. Este contraste é sobretudo evidente nas estações do ano menos pluviosas e em zonas de agricultura de sequeiro ou de matos mediterrânicos.

Estes corredores de vegetação constituem um sistema de interface entre o meio aquático e o meio terrestre (ecótono), com uma identidade florística e estrutural caracterizada pela ocorrência de espécies adaptadas a regimes torrenciais e intermitentes de caudais. Estas características são particularmente evidentes em sistemas fluviais do Centro e Sul da Península Ibérica, onde os corredores ripários são considerados habitats de excepção – “oásis lineares” - numa feliz expressão de González-Bernáldez et al. (1989).

De facto, nas regiões de clima mediterrânico, a vegetação ribeirinha, incluindo a sua componente lenhosa é constrangida por factores hidrológicos, geológicos, climáticos e de uso do solo, estruturando-se em faixas de largura reduzida, frequentemente com menos de 10 metros. Nestas regiões, as expressões galeria ribeirinha ou galeria ripícola assumem a sua verdadeira acepção, uma vez que está implícita a maior importância da dimensão longitudinal face à lateral. Em oposição, as florestas ribeirinhas de regiões com climas tropicais e sub-tropicais possuem uma elevada densidade e extensão lateral, chegando a atingir várias centenas de metros. O termo floresta-galeria deve ser reservado para nomear estas formações. Por sua vez, os bosques ribeirinhos de climas temperados húmidos apresentam um desenvolvimento lateral intermédio, havendo referência a formações lenhosas em zonas aluvionares com cerca de 150 metros de desenvolvimento lateral.

As formações lenhosas típicas dos cursos de água temporários, de regime torrencial e sujeitos a acentuada secura estival (variante mais “rica” do clima mediterrânico) são dominadas por espécies de folha persistente, como o loendro (Nerium oleander), ou com adaptações à secura, como o tamujo (Flueggea tinctoria) e a tamargueira (Tamarix africana). Nestas regiões, de características semi-áridas, a componente herbácea tem uma expressão muito reduzida em termos de cobertura/abundância, mas continua a existir uma riqueza florística relativamente elevada, da ordem das 20-30 espécies recenseadas na área inundável de Inverno, a maior parte sob o copado arbustivo.

 


Figura I Tamujal no Rio Guadiana (Estrela 1998).

Em linhas de água de carácter permanente ou torrencial com menor estiagem, estas espécies são substituídas por bosques caducifólios, como os amiais (amieiros, Alnus glutinosa), salgueirais arbóreo-arbustivos, freixiais (freixos, Fraxinus angustifolia), e mais raramente olmedos (ulmeiros, Ulmus minor), muito dependentes da cambiante edáfica e geomorfológica.

Embora existam formações monoespecíficas, ou seja, amplamente dominadas por uma dada espécie lenhosa, nestes bosques ribeirinhos é frequente encontrar uma zonação transversal na composição da flora lenhosa, dependente do gradiente de humidade, com espécies adaptadas às condições geomorfológicas e edafo-climáticas, e reflectindo em maior ou menor grau a alteração do sistema. Num sistema menos modificado, é frequente ocorrer uma primeira banda de amieiros e/ou salgueiros, seguida de freixos e choupos-negros (Populus nigra). São também frequentes no sub-bosque o pilriteiro (Crataegus monogyna), o sabugueiro (Sambucus nigra), sanguinho-de-água (Frangula alnus), o loureiro (Laurus nobilis). Em contraste, no nosso país, em rios de pequena dimensão e nas zonas montanhosas do Noroeste e Norte-Centro do país (e.g. Serras da Estrela, Peneda, Gerês), surgem sobretudo formações arbustivas dominadas por urze branca (Erica arbórea) e acompanhadas por sanguinho-de-água.

Em sistemas mais perturbados, há uma perda de conectividade longitudinal por fragmentação dos corredores ripários, e uma maior pobreza florística, com intrusão de espécies exóticas, como espécies do género Acácia, a cana (Arundo donax), o ailanto (Ailanthus altíssima), que chegam a formar cordões monoespecíficos. Em locais com grande perturbação física, as silvas, sobretudo a espécie Rubus ulmifolius, apresentam grande cobertura, quer na orla das formações ribeirinhas, quer penetrando no seu interior, ou mesmo substituindo as formações arbustivas em rios de pequena dimensão.

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