Risco de predação e doenças
A acumulação de uma grande densidade de indivíduos em migração, essencialmente a jusante do obstáculo, constitui um alvo fácil para predadores piscícolas e mesmo para algumas aves ou mamíferos. Este facto deriva do desgaste físico a que os peixes são submetidos, devido às inúmeras tentativas de transposição das barreiras; ou mesmo na passagem sobre o paredão e através das turbinas, que os deixa um pouco “desorientados”. O conjunto de comportamentos assinalados pode ser também responsável por um acréscimo na susceptibilidade à ocorrência de doenças.
PASSAGENS PARA PEIXES (PPP)
A construção de PPP é a principal medida mitigadora do efeito barreira na ictiofauna, restabelecendo a conectividade longitudinal dos sistemas fluviais. O fundamento da sua construção remonta à época em que o Homem observou a dificuldade de alguns peixes se locomoverem face a obstáculos geológicos naturais, resolvendo facilitar a sua mobilidade através da edificação de PPP. A primeira infra-estrutura com esta função foi colocada na Suíça em 1640, num obstáculo natural. Por outro lado, o primeiro dispositivo de transposição piscícola edificado numa barreira de origem antrópica remonta a 1828, na Escócia. Em termos genéricos, uma PPP pode ser definida como um caminho artificial, alternativo ao curso de água onde foi edificada uma barreira, que para a ictiofauna dulçaquícola se apresenta intransponível ou dificilmente superável. O princípio geral de funcionamento consiste em atrair os peixes migradores a um ponto do sistema fluvial, a jusante do obstáculo, e incitá-los a deslocarem-se para montante através de uma estrutura onde flua água – PPP em sentido restrito (bacias sucessivas ou deflectores) –, ou capturá-los numa cuba, que após elevação mecânica os liberte a montante – ascensores e eclusas.
No dimensionamento das PPP devem ser consideradas as condições hidrodinâmicas – sobretudo a velocidade da água e o regime de escoamento – à entrada e no interior do dispositivo, para além de conhecimentos sobre a fisiologia, ecologia e comportamento no processo migratório das espécies-alvo. A generalidade dos autores considera cinco tipos principais de PPP: passagens por bacias sucessivas, passagens ou deflectores do tipo Denil, eclusas, ascensores e passagens naturalizadas.
As
passagens por bacias sucessivas foram o primeiro tipo de dispositivo de transposição construído para fazer face a obstáculos naturais ou artificiais, sendo frequentemente utilizadas em França durante o século XIX. Actualmente é o modelo de PPP de utilização mais comum, sendo sobretudo utilizadas para vencer desníveis pouco pronunciados, como acontece na generalidade das mini-hídricas. O princípio geral do funcionamento consiste em dividir o desnível a vencer em várias quedas consecutivas de menor dimensão, através da construção de pequenas bacias que escoam água entre si de montante para jusante. São vulgarmente denominadas de escada de peixes, dada a sua configuração basear-se em bacias escalonadas em forma de degraus, formando um canal por onde os indivíduos se movimentam e transpõem as bacias nadando na coluna de água, ou em algumas situações por salto. A adequação das PPP por bacias sucessivas às espécies/famílias mais representativas nos troços onde as estruturas são colocada realiza-se através de modificações nos critérios de dimensionamento hidráulico.
Os deflectores ou passagens do tipo Denil começaram a ser utilizados na Bélgica no início do século passado. São caracterizados por apresentarem um canal rectilíneo de secção rectangular, possuindo um declive acentuado – entre 12% a 20% – e nas paredes e/ou fundo são implantados deflectores (em forma de U e dispostos num ângulo com aproximadamente 45º) com o intuito de reduzirem a velocidade média do escoamento. É um tipo de PPP adequado para a transposição de obstáculos de pequena dimensão e/ou em locais onde a disponibilidade de espaço seja um factor limitante. Apresentam usualmente caudais de atracção facilmente identificáveis pela ictiofauna, embora sejam bastante sensíveis a variações do nível da água a montante do obstáculo. É um tipo de PPP muito selectivo, dirigido maioritariamente para taxa que apresentem elevadas velocidades de natação e grande resistência, nomeadamente os salmonídeos; a sua utilização por espécies de menores dimensões e com baixa capacidade natatória é improvável.