A Apanha de Algas no Sudoeste Alentejano

Dora Jesus
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Apesar da época oficial se iniciar a 15 de Julho de cada ano (estendendo-se até 15 de Novembro), a azáfama começa uns meses antes, porque é necessário renovar licenças e equipamento, solicitar vistorias às embarcações e equipamentos respectivos, pintar e limpar, afinar motores e compressores e escolher os homens para a safra desse ano, tudo para que na data oficial barcos e homens estejam prontos para mais uma das já muitas safras de limo que contam no seu currículo.


A época oficial para a época de apanha não é criteriosamente seguida, nunca começa antes da data oficial e nunca acaba na data oficial e raramente se consegue trabalhar mais do que 4 dias seguidos, e em raros anos de sorte consegue-se trabalhar 25 dias, porque nesta actividade quem manda é o mar e é ele que, quase sempre, decide quando se trabalha.

Um dia durante esta época começa bem cedo, quase madrugada ainda (6 – 7:00 da manhã), quando os homens se reúnem no pequeno porto de pesca da Azenha para olharem o mar e decidirem entre eles se mergulham nesse dia.


Quando o “mar é capaz”, agrupam-se em pequenas embarcações de apoio que os levam aos barcos da apanha submarina de algas, pintados de amarelo-dourado, e com nomes tão diversos como “Zezé”, “Lina Graça”, “Sesimbra Bela”, “Santa Susana” ou “Paulo Duarte”.


Os barcos dividem-se entre barcos grandes, que trabalham com um máximo 6 mergulhadores e 1 ou 2 “moleques”, que têm como função puxar as redes cheias de algas, entregues pelos mergulhadores, para a embarcação e arrumá-las convenientemente para que a embarcação esteja sempre equilibrada; e os barcos pequenos, conhecidos como “apolos”, que funcionam com um máximo de 4 mergulhadores (consoante o tamanho) e um “moleque”.


A apanha submarina de algas é uma actividade extremamente violenta fisicamente, pelo que a preparação de um dia de trabalho é um ritual seguido a preceito por todos os mergulhadores, pois dele dependem a prevenção de acidentes e, em último caso, as suas vidas: todos os pequenos pormenores são verificados, com especial atenção para as condições do aparelho (regulador) por onde respiram, e para o estado dos fatos de mergulho (o mais pequeno rasgão num fato pode provocar feridas devido à fricção constante, bem como ser um foco permanente de entrada de água ... fria).

A prevenção, aprendida e transmitida ao longo dos anos, para factores como o frio e o desconforto provocado pelas longas horas de imersão, é tomada em linha de conta no seu ritual diário; é prática comum ligar os pulsos, para assim evitar “pulsos abertos” e diminuir-se a dor do movimento milhares de vezes repetido; a colocação de uma prancha de madeira ou barbatana velha na zona lombar para evitar curvar as costas e manter direito o tronco é outra prática; vestir debaixo do fato de mergulho meias de vidro é outra das práticas comuns, esta para além de ajudar a combater o frio, facilita os movimentos e evita que os fatos, pela fricção constante na pele, provoquem cortes e queimaduras que dificilmente saram quando constantemente expostas ao mesmo movimento e à água salgada.

Com o ritual cumprido (não demora mais do que uns 15-20 minutos), eis que está na hora de começar mais um dia de trabalho nas profundezas, o compressor é posto a trabalhar, verificam-se mais uma vez os aparelhos de respiração; estes homens são mergulhadores semi – autónomos, o que significa que utilizam um equipamento de mergulho de circuito aberto autónomo de baixa pressão (narguilé), encontrando-se dependentes do compressor existente no barco que recolhe ar atmosférico e o envia através de mangueiras para poderem respirar debaixo de água. Estas mangueiras são o seu “cordão umbilical”.


Atiram-se para a água como calha, descem rapidamente até ao fundo e prontamente começam a recolher, à força de pulsos, algas para dentro de um saco de rede (xalavar) colocado à cintura. Quando o saco está cheio, os mergulhadores dão sinal ao “moleque” que estão prontos para subir, dois/três puxões na mangueira e o “moleque” começa a recolher a mangueira, mangueira a que os mergulhadores se agarram e que durante breves instantes é também significado de descanso. Chegados ao barco, o saco cheio é colocado num guincho e recolhido para bordo, e outro saco vazio é entregue ao mergulhador, que prontamente inicia a descida.

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