Calendário venatório 2015-2016: Mais uma autorização para contaminar com chumbo e abater espécies ameaçadas

FAPAS, GEOTA, Quercus e SPEA (06-04-2015)
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A proposta de portaria que define o calendário venatório para 2015-2016, do Secretário de Estado da Alimentação e da Investigação Alimentar, que tutela a caça, não traz qualquer avanço para uma prática cinegética mais sustentável. A administração prepara-se para continuar a autorizar o uso de munições com chumbo e o abate de espécies que caminham a passos largos para a extinção.

Teve lugar na semana passada no Ministério da Agricultura e do Mar uma reunião promovida pelo Secretário de Estado da Alimentação e da Investigação Alimentar, que juntou o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), as organizações do setor da caça e as organizações não governamentais de ambiente (ONGA). O objetivo era discussão da proposta de calendário venatório para 2015-2016.

A proposta é, no essencial, igual ao calendário anterior, em vigor há três anos. Apresenta várias normas que agravam a situação das espécies cinegéticas como o abate de galinhola durante a migração pré-nupcial, o que viola o direito europeu e nacional, o abate de espécies de patos ameaçadas, com populações diminutas (algumas com menos de 500 indivíduos), e o abate de rola-brava, que é uma espécie cujas populações diminuíram 73% desde 1980, e que enfrenta um sério risco de extinção em vários países da Europa.

As ONGAs defendem uma suspensão temporária da caça à rola-brava. Esta medida deverá ser acompanhada por uma monitorização que permita avaliar o seu efeito nas populações e pela implementação do Plano de Gestão da Comissão Europeia para a espécie. As associações do setor da caça concordam, mas argumentam que Portugal não pode avançar sozinho na proteção desta espécie. Mas o que é mais extraordinário, é que o ICNF diz o mesmo. É confrangedor ver um organismo público de defesa da natureza a argumentar esta e outras falácias, como a falta de informação, para perpetuar medidas destrutivas das espécies cinegéticas.

Contudo, a situação mais revoltante é o uso de munições de chumbo. Estão publicados em inúmeros artigos e relatórios científicos os efeitos tóxicos do chumbo libertado pela caça, nas águas, nos organismos aquáticos, nos patos, nas aves de rapina e também nas pessoas. Muitos estudos provam que o chumbo disparado pelos caçadores acaba por vir parar ao prato das pessoas que consomem caça e produtos de caça. Em 2006, foi acordado pelos ministérios da Agricultura e do Ambiente que o uso de munições de chumbo seria retirado faseadamente da atividade cinegética em Portugal. Mas passaram 9 anos e continuamos apenas com a interdição do uso de munições de chumbo em zonas húmidas dentro de áreas protegidas, mas sem aplicação prática, pois esta norma nunca foi regulamentada, tornando impossível o trabalho de fiscalização das autoridades. Ou seja, em todo o território os caçadores podem continuar a espalhar chumbo à vontade.

As ONGAs consideram a caça com munições de chumbo uma prática inaceitável duma sociedade informada e responsável, que deve ser abolida em todos os tipos de caça. Mas o Secretário de Estado da Alimentação de Portugal (Europa Ocidental), no século XXI, prefere atender aos alegados problemas de ricochete e de conservação das estrias das armas dos caçadores, em vez de retirar o chumbo de vez do prato dos portugueses.

Concluindo, em Portugal o cidadão não ganha nada em ter o Instituto da Conservação da Natureza e Florestas e um Secretário de Estado da Alimentação e da Investigação Alimentar a tutelar a caça.

Quando a administração não cumpre as suas obrigações, só nos resta apelar aos cidadãos. As ONGAs apelam aos caçadores para não caçarem com munições de chumbo e para não caçarem espécies ameaçadas, como a rola, o zarro, a negrinha ou pato-colhereiro. Apelam a todos os portugueses para que não consumam caça ou produtos de caça, enquanto se puder caçar com chumbo. Pela sua saúde!

*Escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico

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