Entrevista com Dr. Luís Roma Castro

Maria Carlos Reis
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A situação do Lince em Portugal, a sua ecologia, as medidas de gestão e as perspectivas da sua conservação, são apresentadas por um técnico do Instituto de Conservação da Natureza, Dr Luís Roma, que desde 1990 tem trabalhado com a espécie.




1 - Qual a sua formação?

Sou biólogo de formação.

2 - Quais as funções que desempenha no Instituto da Conservação da Natureza?

Comecei como estágiário na Malcata em 1990, e desde aí dedico a maior parte do tempo ao Lince.

3 - Porque é que o Lince é considerado a espécie mais emblemática de toda a política de conservação em Portugal?

Talvez não a mais emblemática, mas a mais mediática. Por um lado, a situação de ameaça em que a espécie se encontra, sendo considerada a espécie de felídeo mais ameçada do planeta. Por outro lado por valores ecológicos, estéticos e éticos, por ser um predador o que o torna atraente para o público em geral. Ainda pelo facto da relação polémica que estabeleceu ao longo dos tempos com caçadores, por ser predador. É também uma espécie de difícil observação, que existe quase como um "fantasma", o que atribui um grande valor a observações e à detecção de vestígios no meio conservacionista.

4 - O Lince é um predador de topo, que se alimenta exclusivamente de Coelho ou inclui na sua alimentação outras espécies?

Todos os estudos de dieta, desde os anos 70, apontam para o consumo preferencial de Coelho. Alimentam-se também de outras espécies, como pequenos roedores e insectívoros, até grandes mamíferos, como cervídeos, e também de aves. 
 
5 - A Raposa é uma generalista, que está a expandir a sua ocupação. Se o Lince também inclui na sua dieta outras espécies, porquê atribuir-se ao declínio das populações de coelho o declínio das populações de lince?

Estudos comportamentais, de evolução, de paleontologia apontam para que o Lince ibérico tenha descendido de um lince africano, um ascendente comum a todas as espécies actuais de Lince. Quando esse lince chegou à Península Ibérica, no Plistocénio ou Pliocénico, encontrou uma comunidade de carnívoros completamente diferente da actual e deparou-se com uma série de pressões competitivas de outras espécies de felídeos e outros carnívoros. Os carnívoros de grande e médio porte actuavam preferencialmente sobre ungulados, e o Lince, apesar das dimensões um pouco maiores desse ancestral, sofreu a tendência de diminuir de dimensões para se adaptar a uma espécie semelhante ao Coelho que existia na altura, que seria abundante. Terá, assim, existido uma evolução conjunta entre o Lince e o Coelho. O comportamento e ecologia das duas espécies apontam para que o consumo de um Coelho seja suficiente para as necessidades médias diárias de um Lince.

Tudo isto terá levado a uma especialização alimentar. A comparação com a Raposa tem interesse, pois são carnívoros em pólos opostos em termos de estratégia alimentar. O que se sabe é que os Coelhos eram abundantes, que se reproduziam muito facilmente e em grande escala, até aos anos 50, até à intervenção do Homem de forma maciça no habitat e à introdução de doenças do Coelho. Como tal, o Lince não tinha motivos de preocupação. Foi uma estratégia positiva durante, possivelmente, milhares de anos.

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