Origem e Evolução das Borboletas

Teresa Catry
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As borboletas são o grupo mais popular dos insectos. Admiradas desde sempre pela sua beleza e elegância, elas foram coleccionadas durante séculos, tendo sido alguns coleccionadores os primeiros a dedicarem-se ao seu estudo científico.

Na classe dos insectos, a ordem das borboletas (Lepidoptera) constitui um dos grupos mais evoluídos e ricos em espécies, com cerca de 165 000 espécies identificadas em todo o mundo (cerca de 5 000 na Europa), número apenas superado pela ordem dos coleópteros (onde se incluem os conhecidos escaravelhos). Os lepidópteros estão presentes na grande maioria dos habitats naturais, existindo espécies com adaptações próprias às características de cada habitat, sendo o clima o principal factor que determina a área de distribuição das borboletas a nível global. Estão apenas ausentes no Árctico, Antárctico e nas altas montanhas com neves e gelos perpétuos.

A principal característica dos lepidópteros prende-se com o facto de possuírem inúmeras escamas que cobrem o corpo e as asas, dando a estas últimas múltiplos padrões de coloração. A própria palavra Lepidoptera significa literalmente “asas com escamas”. Outra característica diagnosticante comum à grande maioria dos insectos desta ordem é a presença de um proboscis, isto é, uma tromba de comprimento variável, enrolada em espiral, e que tem como função libar o néctar das flores e a água do orvalho.

Os lepidópteros são vulgar e empiricamente divididos em dois grupos, as borboletas e as mariposas. De um modo geral, são incluídas no primeiro grupo as borboletas coloridas que voam durante o dia e, no segundo, as borboletas com tons menos apelativos e que voam à noite. É verdade que em muitos casos estes pressupostos são verificados; no entanto, existem inúmeras excepções, de tal modo que esta é apenas uma divisão de conveniência, sem grande base científica. As antenas dos lepidópteros constituem uma característica diagnosticante utilizada na sua divisão em dois grandes grupos. A grande maioria das borboletas diurnas, incluindo todas as espécies europeias, têm antenas longas e filiformes, sendo por isso designadas por Rhopalocera. As mariposas têm maioritariamente antenas denticuladas ou pectinadas (mais raramente filiformes), estando assim incluídas no grupo designado Heterocera.

Evolução

Do ponto de vista histórico, os lepidópteros constituem um grupo relativamente recente. Apesar desse facto, muitas teorias foram apresentadas no intuito de identificar os ancestrais dos lepidópteros e grande parte das ordens da classe dos insectos foi considerada como o grupo que lhes deu origem. A maioria destas sugestões é puramente conjectural, uma vez que o registo fóssil conhecido é manifestamente insuficiente para formar uma ideia clara. Sabe-se, no entanto, que a ordem mais próxima é a ordem Trichoptera (insectos de tamanho pequeno a médio, de aspecto geral semelhante às mariposas). Apesar deste facto não significar que os tricópteros sejam os ancestrais dos lepidópteros, parece provável que os dois grupos tenham evoluído de um ancestral comum, há cerca de 250 milhões de anos, durante o Pérmico.

Fotografias de José Romão

São conhecidos alguns fósseis, datados do Triássico, cuja forma se assemelha à de uma mariposa, não existindo, porém, a certeza se representam mariposas primitivas ou tricópteros. Embora as mariposas mais primitivas tenham coexistido com os dinossauros no Jurássico, há cerca de 150 milhões de anos, foram descobertos poucos fósseis relativos a esse período. Já nos depósitos rochosos do Cretácico Inferior, há 120 milhões de anos, identificaram-se inúmeros fósseis pertencentes, indubitavelmente, a um vasto leque de mariposas primitivas. Apesar de não serem conhecidos fósseis de borboletas deste período (o primeiro foi encontrado no Eocénico, há apenas 50 milhões de anos), estas já deveriam existir e foi a partir do registo fóssil do Cretácico que se tornou um pouco mais evidente a evolução dos lepidópteros. No início do Oligocénico, há 40 milhões de anos, existiam já todas as principais famílias de borboletas e a morfologia geral das espécies fósseis é semelhante à das borboletas actuais.

É aceite, de um modo geral, que as borboletas evoluíram a partir de uma forma de mariposa e inúmeras famílias de mariposas foram sugeridas como ancestrais das borboletas mas, uma vez mais, o registo fóssil é escasso para tecer certezas. Actualmente pensa-se que as borboletas e as mariposas de maiores dimensões evoluíram de um ancestral comum ainda não identificado.

O estudo dos fósseis não permite obter informação sobre os hábitos de voo dos primeiros lepidópteros, sendo impossível dizer com certeza se voavam de dia ou de noite. No entanto, os indivíduos das famílias com origem mais primitiva são maioritariamente diurnos, sendo assim provável que as primeiras mariposas fossem também diurnas. Muitos destes lepidópteros terão posteriormente adquirido hábitos nocturnos, em consequência da intensa predação por aves em grande expansão nos períodos Cretácico e Terciário. De facto, a acção conjunta de predadores, como aves, mamíferos, répteis e anfíbios, foi certamente suficiente para encorajar a evolução de hábitos nocturnos em muitas famílias de mariposas. No entanto, algumas famílias permaneceram diurnas, protegidas dos predadores por propriedades gustativas de aversão e coloração aposemática (coloração intensa de aviso contra predadores). Parece também provável que, em resposta à predação por morcegos, alguns lepidópteros com hábitos de voo diurnos, e pertencentes a famílias que são hoje predominantemente nocturnas, tivessem revertido à vida diurna depois de um período desvantajoso de actividade nocturna.

A evolução dos lepidópteros está também fortemente associada à evolução das plantas angiospérmicas (plantas com flor), das quais os primeiros se alimentam e são dependentes. Os primeiros lepidópteros deveriam ter trombas curtas e alimentar-se-iam de néctar apenas em flores com nectários extra-florais, mas também de outras fontes de açúcar, tais como a seiva. A evolução dos longos proboscis destes insectos decorreu paralelamente com a evolução de flores com nectários menos expostos, localizados em locais menos acessíveis e que dependiam das borboletas e mariposas com trombas compridas para a polinização. O registo fóssil demonstra que as primeiras angiospérmicas apareceram no início do Cretácico, há cerca de 130 milhões de anos, período em que todos os lepidópteros existentes tinham mandíbulas adaptadas a cortar (à semelhança da actual família Micropterigidae, constituída por mariposas que voam de dia) e se alimentavam de pólen. Neste período outros insectos da família das moscas e das abelhas eram os principais polinizadores das plantas com flor e apenas no Terciário se deu a explosão de formas de angiospérmicas e de lepidópteros, tendo início o processo de co-evolução, que os tornou mutuamente dependentes.

 

Bibliografia

Borror, J.D. e M.D. DeLong (1988). Introdução ao estudo dos insectos. Editora Edgard Blucher Ltda. São Paulo. Brasil.

Chinery, M. (1989). Butterflies and Day-flying Moths of Britain and Europe. Collins New Generation Guide. London.

Moucha, J. e B. Vancura (1983). A colour guide to familiar Butterflies, Caterpillars and Chrysalides. Octopus Books Limited. London.

Reichholf-Riehm, H. (1984). Borboletas. Círculo de Leitores. Lisboa.

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