Mutualismo, cooperação ou oportunismo?

Alexandre Vaz
Imprimir
Texto A A A

Organismos de grupos muito distintos estabelecem por vezes relações complexas entre si, nalguns casos de total interdependência. As formas de cooperação, pelo menos aparente, são dos resultados mais fascinantes da evolução da vida.

No mundo natural, quase todos os seres vivem embrenhados numa complexa teia de relações que se estabelecem entre representantes dos diferentes grupos taxonómicos. As relações de predador-presa, herbívoro-planta e de parasita-hospedeiro, são um exemplo disso mesmo. Em todos estes casos, há uma característica em comum: entre os parceiros destas relações existe uma pressão selectiva comum, mas em sentidos opostos. Ou seja, à pressão imposta pelos predadores, herbívoros e parasitas, sobre as presas, as plantas e os hospedeiros, estes últimos respondem com uma contra adaptação para evitar a pressão.

Pelo contrário, no caso das relações mutualísticas, ambos os parceiros beneficiam das pressões selectivas recíprocas, através de um processo que se designa por co-evolução. O que na prática quer dizer que se ajudam mutuamente. Dentro do mutualismo existem muitas modalidades diferentes, mas o factor comum que conduziu os diferentes organismos a evoluir neste sentido permanece ainda por explicar. Na verdade, verifica-se que muitas relações mutualísticas são mais explorações recíprocas, do que esforços cooperativos entre indivíduos.

Em todo o caso, este tipo de relação atrai de forma particular a atenção dos humanos, que facilmente encontram aqui uma analogia com sentimentos como a amizade ou o altruísmo. Mesmo assim se nos debruçarmos mais profundamente sobre o paralelo, as conclusões sobre o porquê da amizade poderiam ser também algo desconcertantes: será que amizade é motivada por questões de altruísmo ou de egoísmo? Afinal, se calhar até as próprias relações entre as pessoas se podem arrumar, pelo menos de forma metafórica, dentro das categorias: predação, parasitismo e mutualismo…

O mutualismo pode, ser ou não simbiótico e pode ser facultativo ou obrigatório. O mutualismo simbiótico, ou simplesmente simbiose, é aquele em que ambos os organismos vivem juntos numa associação física muito próxima e em que pelo menos um deles não poderia viver independente do outro. A simbiose é por isso sempre um caso de mutualismo obrigatório.


Na verdade, apesar das relações de simbiose existirem um pouco por todo o lado, na sua maioria não são nada óbvias, e muitas vezes utiliza-se essa designação (simbiose) de forma abusiva para outros tipos de mutualismo. As relações entre organismos simbiontes são por vezes tão profundas que chega a ser difícil distingui-los. Um exemplo disso é uma associação de algas e fungos que constitui os líquenes. Também no coral, os Celenterados associam-se a algas que lhes fornecem mais de 80% da energia de que necessitam, em troca da retenção de nutrientes essenciais que provêm da sua habilidade em capturar o zooplancton em suspensão no Oceano. Nas raízes de muitas plantas, que vivem em solos pobres, estabelecem-se relações simbióticas com fungos, que em troca da energia fotossintética fornecida pelas plantas fornecem nutrientes minerais que captam do solo.

O mutualismo obrigatório não simbiótico é um tipo de mutualismo mais frequente do que o anterior. Neste caso, os intervenientes dependem um do outro para sobreviver mas não vivem fisicamente tão próximos. A polinização de flores e a dispersão de sementes está em alguns casos absolutamente dependente de um agente, que pode ser um insecto, uma ave, ou outro animal, que dependa desse recurso, néctar, pólen ou fruto, para sobreviver. Também algumas espécies de formigas vivem dentro dos troncos de árvores, que para alem de abrigo, lhes fornecem alimento através de substâncias açucarinas que segregam, em troca de protecção contra insectos desfolhadores. Também as térmitas da savana africana criam fungos dentro dos seus ninhos, que lá encontram as características indispensáveis para se desenvolverem e que lhes degradam parcialmente o alimento.

O mutualismo facultativo ou oportunista não só é o mais frequente, como provavelmente o mais visível de todos os tipos de mutualismo, já que opera em maior escala ao nível dos animais vertebrados.

Comentários

Newsletter