Causas do declínio global dos anfíbios

Nuno Leitão
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O declínio e a perda de populações de anfíbios são hoje um problema global, com causas complexas e ainda por clarificar. Vários factores, actuando isoladamente ou em conjunto, serão responsáveis por este fenómeno.

Hoje em dia, existe consenso quando se refere que os anfíbios estão em declínio global. Os anfíbios são vertebrados mais sensíveis às alterações ambientais do que qualquer outro grupo de vertebrados terrestres. Além de serem exotérmicos, em diferentes estágios dos seus ciclos de vida, frequentam habitats aquáticos e habitats terrestres e, devido à sua pele muito permeável, são muito susceptíveis a toxinas e alterações dos padrões de temperatura e precipitação.

Os anfíbios têm sido, por diversas vezes, objecto de estudos experimentais e de monitorização. Os estudos da sua ecologia na natureza foram, de uma maneira geral, conduzidos em agregações que se verificam nos locais de reprodução, mas ainda pouco se sabe dos seus movimentos e actividades fora desses locais. Assim, ainda se está muito aquém de se compreender, como noutros grupos taxonómicos, a dinâmica das populações de anfíbios.

 

De qualquer forma, a informação existente aponta para diferentes tipos de causas que, actuando em conjunto ou isoladamente, deverão ser as principais responsáveis por este declínio. Estas causas são:


Alteração do habitat

A modificação do habitat é a causa do declínio dos anfíbios mais bem estudada. A perda de habitat tem como consequência a redução da abundância e da diversidade dos anfíbios. A conservação dos meios aquáticos de reprodução é ineficaz se não se tiver em conta o habitat terrestre envolvente, que é utilizado pelos anfíbios como local de abrigo e de alimentação. Assim, por exemplo, a drenagem de zonas húmidas implica a remoção de locais de reprodução, mas por outro lado, a remoção ou modificação das florestas tem um rápido e severo impacto nalgumas populações de anfíbios, devido a modificações microclimáticas, compactação e secura dos solos e redução da complexidade do habitat. Alterações, mais subtis, na condução da vegetação, que levem, por exemplo, ao aumento do ensombramento, podem, também, ter consequências negativas para algumas espécies de anfíbios.

Predação

As larvas dos anfíbios são extremamente vulneráveis a predadores vertebrados e invertebrados. A diversidade de anfíbios é frequentemente baixa em habitats com peixes predadores. As larvas de espécies de anfíbios que coexistem com predadores aquáticos desenvolveram mecanismos de defesa, contudo as introduções generalizadas de peixes predadores e do Lagostim-vermelho expôs os anfíbios nativos a predadores com os quais nunca tinham interagido, podendo-se verificar taxas de mortalidade significativas, e mesmo levar a uma rápida extinção local dos anfíbios.

Uma situação menos directa, verificou-se no Reino Unido com o Sapo-corredor. Muitas populações de Sapo-corredor mantiveram-se em habitats sem peixes predadores, mas ficaram isoladas das populações com habitats sujeitos a colonizações de predadores exóticos, o que eventualmente poderá levar à extinção local.

O Homem tem sido, também, responsável por predação directa, principalmente devido ao comércio de pernas de rã.

 


Radiação Ultravioleta

A diminuição do ozono da estratosfera, com consequente aumento da radiação ultravioleta (UV) ao nível a superfície terrestre estimulou a teoria de que a fraca resistência dos embriões à radiação seria uma das causas do declínio. Com efeito, a capacidade de recuperação dos danos derivados da radiação UV (através de uma enzima - fotoliase) é superior nas espécies de anfíbios não ameaçados e inferior nas espécies em declínio. A radiação UV associada a situações de natureza patogénica ou pH baixo, tem em algumas situações efeitos mais marcados.

Na maioria dos meios aquáticos, a radiação UV é absorvida, principalmente, nos primeiros centímetros de profundidade, pelo que a radiação deverá afectar apenas espécies que utilizem como local de reprodução habitats aquáticos pouco profundos, mas também zonas de águas límpidas, principalmente em zonas de elevadas altitudes.

Apesar do efeito da radiação nos embriões ser inquestionável, não se sabe até que ponto, por ser de difícil estudo, é significativa a taxa de mortalidade, que daí deriva, para o declínio dos anfíbios.

 

 

Acidez e Toxicidade

Os meios aquáticos ácidos (pH baixo), têm grandes impactos na distribuição e reprodução dos anfíbios e na sobrevivência e desenvolvimento dos seus ovos e larvas. Os anfíbios, variando com a espécie, são sensíveis a baixos valores de pH, e a factores resultantes, principalmente a altas concentrações de alumínio. A acidificação do meio provoca atrasos ou antecipa a incubação, diminuição do tamanho corporal das larvas, alterações no comportamento de natação e redução da capacidade de resposta aos predadores, pelo que aumenta a taxa de mortalidade. Indirectamente, diminui as fontes de alimento disponíveis para os girinos.



Apesar dos efeitos do pH baixo estarem bem documentados, não há dados suficientes que expliquem, por si só, o catastrófico declínio dos anfíbios. As referências dos efeitos de metais e químicos usados nos insecticidas e herbicidas, também são abundantes, mas de igual forma, não são concludentes para a dinâmica das populações. Os tóxicos ambientais, provocam a morte directa e/ou prejudicam a taxa de reprodução, taxa de crescimento e aumentam a susceptibilidade a doenças, por suprimir ou inibir a capacidade de resposta do sistema imunitário dos anfíbios.

Doenças

Foram relacionados declínios de populações com doenças, que se deveriam a factores que de forma directa ou indirecta suprimiam os sistemas imunitários. Os agentes de doenças estão presentes nos animais saudáveis, mas quando os sistemas imunitários estão comprometidos ocorrem as doenças. Há casos documentados de epidemias responsáveis pela mortalidade massiva de anfíbios. Pouco se sabe das doenças dos anfíbios, principalmente no que respeita a viroses.

 

Clima

Condições climatéricas invulgares, nomeadamente condições de seca, provocaram o desaparecimento de populações de anfíbios, principalmente se associadas a outros factores, como doenças ou água com tóxicos. Alterações climáticas registadas num curto espaço de tempo, como um temporal, poderão alterar igualmente a dinâmica das populações de anfíbios. Alterações de climas locais devidas ao aquecimento global, influenciarão certamente a ecologia dos anfíbios. Já se obtiveram associações significativas entre as alterações de padrões de temperatura e reduções populacionais de anfíbios.


A maioria dos estudos invoca interacções entre diversos factores para justificar declínios concretos. Está claro que, nos últimos anos, os anfíbios sofreram um declínio a nível global, mas apesar da muita documentação existente, não se podem ainda tirar conclusões definitivas sobre os efeitos que os factores referidos têm sobre a dinâmica das populações.

 

 

Bibliografia

Alford, A.R. e Richards, J.R. (1999). Global Amphibian Declines: a problem in applied ecology. Annu. Rev. Ecol. Syst. 30: 133-165.

 

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