Ictiofauna dulçaquícola exótica em Portugal Continental

Paulo Pinheiro, AQUALOGUS – Engenharia e Ambiente
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Em Portugal aproximadamente 25% do número de espécies piscícolas fluviais são de origem alienígena. Alguns destes taxa evidenciam uma notável aclimatação aos cursos de água nacionais, podendo representar uma séria ameaça para diversos endemismos ibéricos.

Em Portugal Continental estão actualmente estabelecidas 13 espécies piscícolas dulçaquícolas de origem alienígena, 5 de ocorrência localizada enquanto que as restantes 8 apresentam uma distribuição ampla. Desta listagem foram excluídas a tenca (Tinca tinca) – que apesar de ser classificada por alguns autores como exótica, pelo seu padrão de distribuição disperso e muito localizado, é um caso duvidoso por não existirem certezas de se tratar de um taxon nativo ao alóctone – e o fundulo (Fundulus heteroclitus), por ser uma espécie que ocorre maioritariamente em águas salobras, em Portugal mais concretamente na zona estuarina do rio Guadiana.
 
Deve ser igualmente mencionados duas outras espécies que não tiveram a capacidade de se perpetuarem nas massas de água continentais: i.) o salmão-dos-riachos (Salvelinus fontinalis) que foi introduzida nos finais do século XIX, tendo sido alvo de de sucessivos repovoamentos até à década de cinquenta do século XX, actividade que posteriormente foi abandonada devido à incapacidade dos exemplares deste taxon em subsistir nos cursos de água nacionais; ii.) o barbo “tinfoil” (Barbonymus schwanenfeldii) que é uma espécie com ampla utilização na aquariofilia, tendo sido capturados unicamente dois exemplares em 2005 na barragem de Lucefécit, muito possivelmente libertados por aquariofilistas.

Uma percentagem maioritária das introduções piscícolas em Portugal Continental ocorreu durante o século XX, sendo que alguns destes taxa são actualmente responsabilizados pelo declínio de diversas espécies nativas, nomeadamente endemismos nacionais e ibéricos. Este facto decorre da competição pelos recursos – e.g., alimento e/ou habitat –, predação – de posturas, alevins ou adultos –, hibridação e por ocasionalmente serem vectores de doenças ou responsáveis pela introdução de parasitas.

A expansão de uma percentagem significativa das espécies alienígenas tem sido favorecida pelas transformações induzidas nos sistemas fluviais, nomeadamente a construção nas últimas décadas de barragens de média/grande dimensão. Para além da quebra do contínuo lótico e do incremento da profundidade, estas infra-estruturas hidráulicas oferecem quase sempre flutuações no nível da água, com a consequente presença de margens desguarnecidas de vegetação. Estas “novas” condições ecológicas raramente beneficiam a maioria das espécies nativas, que não estão ecologicamente preparadas para se adaptarem a esses meios, o que faz com que na maioria das situações os sistemas lênticos artificiais estejam dominados, em número e biomassa, por taxa exóticos.

A introdução de espécies piscícolas alienígenas em Portugal apresenta várias origens:


i.) proporcionar maior rendimento das águas interiores, aproveitando primordialmente o enorme valor de algumas espécies para a pesca desportiva – e.g., achigã (Micropterus salmoides) e truta-arco-íris (Oncorhynchus mykiss) –, mas também com o intuito de disponibilizar proteínas apreciadas na alimentação humana – e.g., carpa (Cyprinus carpio). Esta via foi durante várias décadas fomentada pelos Serviços Aquícolas da Área Florestal, sendo actualmente alguns pescadores desportivos o principal foco de dispersão/introdução de espécies exóticas;

ii.) introdução de taxa consumidores de mosquitos vectores da malária – gambúsia (Gambusia holbrooki) –, que antigamente era uma doença bastante disseminada em Portugal;

iii.) fuga/libertação de espécimes de pisciculturas – e.g., góbio (Gobio lozanoi) – ou utilizadas em aquariofília – e.g., chanchito (Australoheros facetus);

iv.) existência de diversos cursos de águas comuns com Espanha, induzindo a que algumas das introduções nesse país – acidentais ou não – se tenham expandido a território nacional – e.g., lúcio (Esox lucius) e peixe-gato-negro (Amieurus melas).

No presente documento pretende-se listar o elenco de espécies piscícolas introduzidas em Portugal Continental, indicando o provável motivo da sua introdução. Com base nos elementos bibliográficos disponíveis, foi também ilustrada a área actual de distribuição para cada taxon e efectuado um resumo sintético da sua ecologia. 

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