A árvore mais mediática

Nuno Cruz António
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Mantendo a política editorial do nosso portal, abordamos mais um tema muito mediatizado de uma forma que pretendemos objectiva, fundamentada e evitando uma linguagem demasiado técnica: os eucaliptos.

 

Um dos temas florestais com maior impacto na opinião pública é a questão dos eucaliptos. É importante realizar dois grandes esforços na abordagem deste problema:´

- Separar as especulações mediáticas dos factos e daquilo que está provado cientificamente.

- Respeitar os diferentes pontos de vista de quem intervém nesta questão, tendo a percepção que até mesmo questões como a "estética" da paisagem não devem actualmente ser consideradas menores.

Enumerar e responder a todas as dúvidas que se levantam seria impossível. No entanto, o esclarecimento de algumas das mais comuns da melhor, mais neutral e resumida, forma possível, com uma linguagem não-técnica, é o que me proponho a fazer. Uma incursão prévia à ficha do eucalipto (Eucalyptus globulus) neste mesmo portal é o que aconselho o caro leitor a fazer antes de continuar a leitura deste artigo.

 

Total da área ocupada:

Comecemos pelos dados concretos. Segundo os dados da Direcção-Geral de Florestas, a área ocupada por eucaliptos (3ª revisão do inventário florestal nacional de 1995) é de 676500 hectares. Tal representa 7.6% do território nacional continental. A nossa floresta ocupa 37.8% da área de Portugal continental. As quatro principais espécies florestais são o pinheiro bravo (ocupa 29% da nossa área florestal), o sobreiro (22%), o eucalipto (21%) e a azinheira (15%).

Ecologicamente:

Quando plantamos eucaliptos numa zona, estamos a "simplificar" o ecossistema, ou seja diminuímos o número de espécies (fauna e flora) que dele fazem parte, bem como o número de interacções que se estabelecem entre elas. Ainda que isso nem sempre tenha de suceder, esta diminuição de complexidade do ecossistema leva normalmente à diminuição da sua resistência (capacidade de manutenção do estado actual) e resiliência (capacidade de retomar o estado original após ter sofrido alterações). Os trabalhos científicos publicados indicam uma diminuição no número de espécies de fauna e flora, tanto acima como abaixo da superfície do solo. A plantação de eucaliptos ou qualquer outra espécie, realizada nos moldes actuais, deixa sempre o solo muito susceptível à erosão durante pelo menos o 1º ano. Na maior parte dos casos, alternativas menos "danosas" são financeiramente incomportáveis.

Produtividade e "desgaste dos nutrientes do solo":


O eucalipto é uma árvore extremamente produtiva e com um crescimento muito rápido. Qualquer árvore, consome, numa fase inicial do seu período de vida determinadas quantidades de nutrientes do solo. A partir de certa altura estes começam a ser devolvidos "à terra" através da queda das folhas, ramos, casca - o denominado ciclo de nutrientes. De uma forma bastante simplificada poderemos dizer que o eucalipto começa a realizar esta "devolução" aproximadamente aos 10-12 anos, exactamente na altura em que é cortado. Sendo assim, ele não tem oportunidade de devolver ao solo o que dele retirou. Este impacto é menor quando se deixam os ramos e folhas no solo, no momento do corte das árvores. Por outro lado, tal pode igualmente trazer complicações devido ao perigo dos fogos.

O conhecimento científico mais recente dá também indicações claras que um dos principais factores perturbadores é o modo como o solo é preparado - tipo de máquinas utilizadas, sua intensidade de utilização, seguimento ou não das curvas de nível.

Consumo de água:


O eucalipto é uma árvore bastante rústica, ou seja, cresce e desenvolve-se em locais bastante desfavoráveis. Tem, no entanto, o denominado "consumo de luxo" de água. Havendo-a, ele aproveitá-la-á, ainda que se dê bem em zonas onde esta é escassa. Resumindo, nos casos extremos - grande disponibilidade e grande escassez de água - eles não constituem um problema. No primeiro caso a água não é um factor limitante, no segundo, eles não têm o recurso disponível para o consumir em excesso. Os problemas ocorrerão nos casos intermédios, ainda que a maior parte dos artigos de imprensa pequem pelo exagero com que apresentam os casos.

Armazenamento de carbono:

Como se pode constatar num artigo neste portal, existe neste momento um claro desequilíbrio na Terra entre o carbono armazenado nos seres vivos e libertado na atmosfera. Os eucaliptos, como qualquer floresta, representam um contributo para inverter esta tendência negativa ainda que não tenham a mesma capacidade de armazenamento que uma floresta com espécies de crescimento lento (carvalhos, por exemplo.).

 

 

Razão da escolha de plantações de eucalipto:


Infelizmente em Portugal, a floresta sofre de dois grandes problemas - falta de gestão e falta de interlocutores. (Recomendo vivamente que a leitura neste portal do artigo sobre o Fundo Imobiliário Florestal e das participações no Fórum sobre os Fogos Florestais). Cerca de 85% da área é privada, o Estado possui aproximadamente 3%, sendo o restante baldios. A maior parte dos proprietários possui áreas muito pequenas, resultantes muitas vezes de partilhas entre herdeiros. Estes acabam por não dar grande importância a estes pequenos terrenos que possuem. A opção acaba, na maior parte dos casos, por ser a plantação de eucaliptos que não exige qualquer trabalho da sua parte e dá um rendimento de 10 em 10 anos. Para ter termos de comparação (valores médios), um pinheiro bravo é cortado ao fim de 55 anos, um sobreiro dá cortiça vendível ao fim de 60 anos e um carvalho é cortado ao fim de 120 anos.

Opções para o futuro:

O forte crescimento da área florestada com eucalipto, não se deveu apenas às suas características fisiológicas fora do comum mas também à explosão no mercado do papel ocorrido nos anos 70. Tal levou a que se os plantassem em locais para onde nunca deveriam ter ido. Isto levou a que nem sequer do ponto de vista económico esta fosse uma opção rendível (muito menos do ecológico).

 

 O papel e a madeira de mobiliário são produzidos com base num recurso natural renovável. A indústria transformadora é uma fonte de riqueza para um a país e garante o emprego de um considerável número de pessoas. No entanto, a conservação da água e da biodiversidade, têm de ser tomadas em consideração nas actividades do sector primário. É, por isso, importante implementar medidas minimizadoras quando se planta um eucaliptal. Como exemplos:

- Começar por se escolher um local adequado;

- Instalar folhosas e vegetação ripícola junto às linhas de água;

- Semear pastagens em parte dos corta-fogos (os eucaliptais podem ser bons locais para veados, por exemplo, desde que estes tenham disponibilidade de água e alimento);

- Realizar uma preparação correcta do solo;

- Deixar no solo os ramos e folhas - o suficiente para o proteger, mas salvaguardando-se o perigo dos fogos;

- Deixar faixas de vegetação arbustiva original, habitat de bastantes espécies de aves e insectos.

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