Reproduzir para Preservar – Conservação de Espécies Piscícolas Ameaçadas

Carla Sousa Santos – Centro de Biociências, ISPA
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A reprodução ex situ de espécies e populações ameaçadas é uma medida de conservação que se pode revelar decisiva na conservação da nossa fauna piscícola nativa, sobretudo se associada a medidas de recuperação de habitat.

Os rios portugueses albergam pelo menos 22 espécies endémicas de peixes, sete das quais consideradas criticamente ameaçadas de extinção. A maioria destas espécies ocorre em pequenas ribeiras do sul, com elevadíssimos níveis de poluição e degradação física e regularmente sujeitas a secas extremas. A persistência das populações é portanto extremamente incerta num futuro em que se prevê uma intensificação da frequência das secas decorrente do efeito estufa.

Neste contexto, é urgente o estabelecimento de programas de reprodução em cativeiro (ex situ) para as espécies mais ameaçadas, de modo a garantir a preservação do valioso património biológico que representam, até que os seus rios de origem se encontrem suficientemente restaurados para voltarem a recebê-las.

 

A reprodução ex situ como instrumento na preservação de espécies criticamente ameaçadas

A reprodução ex situ de espécies em risco de extinção tem vindo a ser reconhecida por um número crescente de autores como uma medida necessária, sempre que os habitats de origem das espécies se encontram tão degradados que a probabilidade de continuarem a suportá-las é baixa ou quando os efectivos populacionais se encontram tão reduzidos que existe risco eminente de extinção se não se tomarem medidas artificiais para os aumentar. Embora não resolva os problemas de conservação, a reprodução ex situ é uma medida a adoptar como salvaguarda contra a extinção até se poderem restaurar os habitats naturais e devolver os animais ao seu habitat original. Isto significa que a reprodução ex situ terá que ser desenvolvida em paralelo com o esforço de restauração de habitats, como frisado no Artigo nº 9 da Convenção para a Diversidade Biológica. No caso dos habitats de água doce, a reabilitação envolve medidas de execução simples e pouco dispendiosa, cuja eficácia tem sido demonstrada em vários cursos de água.

Figura 1 – Rio Sizandro – estado de degradação do habitat de Achondrostoma occidentale, espécie criticamente ameaçada. 

(Autoria: Carla Sousa Santos)

A adopção da reprodução ex situ como medida auxiliar da conservação envolve um conjunto de problemas que é preciso resolver antes de iniciar qualquer projecto de trabalho em larga escala, em particular: i) identificar os comportamentos reprodutores e as exigências de habitat propícios ao desenvolvimento de ovos, larvas e juvenis das espécies a reproduzir; ii) determinar qual o número mínimo de indivíduos a manter na população em cativeiro de modo a reduzir os efeitos negativos do inbreeding e a preservar a maior fracção possível da diversidade genética das populações naturais; iii) em situações em que não há recursos para preservar todas as populações de uma mesma espécie em perigo de extinção e há que seleccionar populações-alvo, torna-se necessário avaliar a diversidade genética das diferentes populações naturais de modo a escolher como alvo a que apresenta o máximo de variabilidade; iv) delinear procedimentos de maneio do stock que minimizem os cruzamentos consanguíneos, envolvendo em cada geração o maior número possível de reprodutores em vez de cair no erro de escolher um pequeno número de “bons reprodutores” para produzir o maior número possível de indivíduos da geração seguinte. A não adopção destas precauções tende a introduzir critérios, mesmo que inconscientes, de selecção artificial e a deprimir a diversidade genética.

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