O declínio do montado - o caso da Serra de Grândola

Luís Neves Silva
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Os montados de sobro e azinho têm sofrido um declínio importante, com graves implicações ecológicas e socio-económicas. Conheça as razões que têm sido apontadas para esse declínio e linhas de investigação que suscitou.

Porque estão em declínio os montados (formações agro-florestais de sobreiro Quercus suber e azinheira Q. rotundifolia), é uma pergunta frequente nos meios agro-florestais. Esta é uma problemática que se insere no quadro de declínio das Quercineas (carvalhos) e que se vem observando um pouco por todo o seu território de distribuição. Vários projectos e linhas de investigação tem procurado a causa que leva a este declínio. Aqui ficam algumas das pistas por onde anda a ciência.



Em entrevista recente, o Dr. Francisco Vázquez (Vázquez, 2000) aborda o tema que por todo o mundo vem sendo definido como "decline oak". Nesta entrevista é descrito um quadro no qual são identificadas as causas ambientais que estarão na origem desta sintomatologia. Alterações climáticas, poluição ou técnicas culturais incorrectas combinam-se, debilitando a arvore até ao ponto em que qualquer desequilíbrio fisiológico a pode levar à morte. Na Península Ibérica são referidas condições de maneio, clima e doenças especificas, às quais se tem dado a designação de "Seca". À "Seca" estão associados todos os processos que interagem sobre o montado (clima, maneio, doenças, pragas, genética, etc) e que dão origem a casos de morte das árvores.

Num outro artigo, publicado na Revista Florestal (Pereira et al., 1999), é revisitada uma das mais divulgadas possíveis causas de mortalidade: o stress hídrico da árvore. Esta é frequentemente considerada como causa primária que predispõe a árvore para o ataque de agentes patogénicos ou insectos (ex. Platypus cylindrus), ou como causa secundária em resultado da predisposição causada pela redução da capacidade de absorção de água em consequência do ataque do fungo Phytophtora cinnamomi. Em todo o caso, é salientado no artigo a falta de resultados experimentais que comprovem estas teorias.



Segundo dados da Direcção-Geral das Florestas (Pereira et al., 1999), uma das áreas mais atingidas pela mortalidade do sobreiro em Portugal é a Serra de Grândola. Esta serra localiza-se no Alentejo Litoral, nos Concelhos de Santiago do Cacém e Grândola, sendo coberta por densos sobreirais. Possui um clima mediterrâneo de influência atlântica, com a precipitação anual média a rondar os 700 mm. A sua área climácica é o Quercion fagineo - Suberis, aliança dominada por carvalhos de folha persistente (Sobreiro e Azinheira), a que se associa o Carvalho cerquinho (Quercus faginea). Nas umbrias menos intervencionadas, aparecem parte considerável das espécies da aliança Quercion fagineo - Suberis, onde se pode observar um matagal mediterrânico riquíssimo. Nas zonas mais empobrecidas, o domínio dos Cistus spp.(arbustos como a Esteva Cistus ladanifer) revelam a aliança Cisto - Lavanduletae, uma etapa degradada do sobreiral. Esta serra é um interessante caso de estudo, onde se tem desenvolvido um conjunto de projectos de investigação que vão permitindo traçar um quadro da evolução e das causas do declínio do montado.



Num estudo realizado pela Estação Florestal Nacional (EFN et al., 1992) na Serra de Grândola, as manchas de montado mais afectadas foram identificadas em solos derivados de xistos, tendo-se constatado que onde o grau de arejamento do solo e a capacidade de infiltração são afectadas acentua-se a ocorrência de sobreiros mortos. No âmbito de um outro estudo (CBA et al., 2000), verificou-se que associado aos solos esqueléticos da serra, as vertentes soalheiras têm uma ocorrência de mortalidade significativamente superior às vertentes umbrias. Em ambos os casos, constata-se que quando sujeito a situações ecológicas extremas, o montado torna-se um ecossistema mais sensível às intervenções no sobcoberto e ao descortiçamento. Nestas situações, observou-se ainda uma correlação positiva entre a incidência de mato de esteva e as situações de mortalidade, situação reveladora de uma regressão do ecossistema.

Apesar dos avanços da ciência, a avaliação das causas que levam ao declínio das quercíneas é um problema ainda sem solução. Este é um problema que se revela a várias escalas e que só a continuação da investigação das inter-relações entre factores como meio ambiente, técnicas de gestão e fisiologia da árvore poderemos vir a alcançar uma resposta.




Bibliografia

CBA, ERENA e CESEE (2000). PRAXIS/PCNA/C/BIA/105/96. Relatório. Lisboa

EFN, DGF e CCAMSC (1992). Determinação das Causas de Morte do Sobreiro nos Concelhos de Santiago do Cacém, Grândola e Sines. Relatório. Lisboa
Pereira, J., Conceição, M. e Rodrigues, J. (1999). As causas da mortalidade do sobreiro revisitadas. Revista Florestal, 12, (1/2).

Vázquez, F. (2000). La seca de las Quercus. Centáurea, Boletim de Información de Tentudia. CEDECO.

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