Acções de conservação para a população de Andorinha-do-mar-anã da Lagoa de Santo André

Inês Catry, Teresa Catry e Manuel Allen Revez
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A mais pequena andorinha-do-mar enfrenta uma forte pressão antropogénica, que ameaça a viabilidade das colónias de nidificação no nosso País. Conheça o projecto de conservação desenvolvido para uma destas colónias e os seus resultados.

A Andorinha-do-mar-anã (Sterna albifrons) é uma espécie migradora, com uma área de distribuição alargada, estando presente nos cinco continentes. Em Portugal tem uma ocorrência estival, observando-se a chegada das primeiras aves, oriundas da África Ocidental, em finais do mês de Março. Está presente, no nosso país, em toda a costa litoral e também em algumas albufeiras do interior, embora a grande maioria da população reprodutora esteja concentrada a sul do Tejo, principalmente na costa algarvia. Nidifica em colónias, preferencialmente em zonas abertas junto à água: ilhas isoladas ou penínsulas, costas com praias arenosas ou com conchas e salinas.

No Livro Vermelho dos Vertebrados Portugueses esta espécie tem o estatuto de “Vulnerável”. A última estimativa nacional aponta para a ocorrência de cerca de 300 casais.

 

 

A Andorinha-do-mar-anã na Lagoa de Santo André

A informação existente sobre o efectivo reprodutor desta espécie na Lagoa de Santo André é escassa e dispersa. Em 1983 foi estimada a presença de 20 a 30 casais reprodutores. Mais tarde, em 1991 e 1992 estimaram-se 12 e 3 casais, respectivamente. Em 1998 e 1999, o Instituto da Conservação da Natureza financiou um projecto para o estudo e conservação da Andorinha-do-mar-anã na lagoa. No primeiro ano do estudo foram contabilizados 9-18 casais. As estimativas até 1992 sugerem um declínio da população na área, havendo posteriormente uma recuperação em 1998.

Igualmente preocupante é o baixo sucesso reprodutor da colónia, sendo que no último ano (1998) a produtividade foi nula. Nesse mesmo ano, 72% das posturas foram destruídas em consequência da elevada taxa de predação (essencialmente por Gralha-preta, Corvus corone) e da intensa perturbação humana associada ao período balnear (e.g. presença de banhistas e pescadores nas zonas de nidificação, circulação de veículos motorizados e de pequenas embarcações de recreio). Os núcleos reprodutores de Andorinha-do-mar-anã na Lagoa de Santo André localizaram-se no cordão dunar da praia de Santo André e nas duas ilhas da lagoa.


Implementação de medidas de conservação


No final da época reprodutora de 1998 foram propostas algumas medidas de conservação visando o aumento do sucesso reprodutor da colónia. Dada a dificuldade de controlo da predação, as medidas propostas visaram, preferencialmente, a redução do impacto das actividades humanas. Estas medidas foram dirigidas às ilhas da lagoa (em particular a Ilha Norte), locais potencialmente privilegiados para a nidificação da espécie uma vez que: (1) constituem zonas naturalmente isoladas, podendo a perturbação humana ser minimizada consideravelmente, (2) a existência de vegetação pouco densa (na Ilha Norte) permite a nidificação e favorece a camuflagem das crias, (3) a predação por mamíferos é muito reduzida e (4) a associação com outras espécies (nomeadamente o Pernilongo Himantopus himantopus) pode aumentar a protecção contra potenciais predadores.



Implementaram-se assim, em 1999, as seguintes medidas:

1. Isolamento das duas ilhas do corpo central da lagoa durante a época de reprodução, com recurso a bóias de marcação colocadas a cerca de 30 metros em volta do perímetro de cada ilha;

2. Desbaste localizado da vegetação da Ilha Norte: criação de 10 zonas circulares com cerca de 1 metro de diâmetro, livres de vegetação, cobertas de areia e com 20-30% da área coberta com conchas de bivalves, uma vez que estas poderão diminuir o risco de predação aérea;

3. Colocação de placares nas margens da lagoa (nomeadamente no local onde se alugam pequenas embarcações de recreio e junto ao parque de campismo) informando o público da existência de um programa de conservação para a Andorinha-do-mar-anã e da necessidade de respeitar as medidas de conservação implementadas.


Avaliação do sucesso das medidas de conservação implementadas

Nidificaram na Lagoa de Santo André, em 1999, entre 34 e 46 casais de Andorinha-do-mar-anã, tendo-se registado uma taxa de eclosão de 41% e uma produtividade mínima de 0.4 juvenis/postura.

As medidas de conservação implementadas permitiram:

1. Aumentar a capacidade de acolhimento da lagoa. Na Ilha Norte foram detectadas 13 posturas (contra as 5 do ano anterior), 6 das quais localizadas nas áreas criadas artificialmente.

2. Diminuir substancialmente a perturbação humana, principalmente nas duas ilhas. Em 1998 verificou-se que o desembarque de pessoas na Ilha Norte foi responsável pelo total insucesso das aves que aí nidificaram. Em 1999 nunca foram observadas pessoas nas ilhas, assistindo-se a um respeito total pelo projecto e pelas regras impostas.

3. Informar e sensibilizar a população local e visitantes para a importância da Lagoa de Santo André na conservação dos efectivos nacionais de Andorinha-do-mar-anã.


O aumento do número de casais de Andorinha-do-mar-anã na lagoa entre 1998 e 1999, assim como a diferença registada no sucesso reprodutor nas duas épocas, não podem ser exclusivamente atribuídos às acções de conservação levadas a cabo na área. No entanto, é evidente que estas mesmas acções foram extremamente importantes para que tal acontecesse. Estes resultados tornam encorajadora a continuação deste tipo de acções na Lagoa de Santo André e a sua expansão a outras colónias noutros pontos do país.

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