Serra de S. Macário - viagem ao Jardim da Pena

Manuel Nunes (texto) e Jorge Nunes (fotografia)
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Por fim, antes dos caminheiros lograrem sequer vislumbrar a povoação de Covas do Rio, atravessar o riacho que banha a povoação e subir o caminho de carro de bois até à entrada da aldeia, a mata retrai-se num súbito esgar de pudor, ante a visão das encostas desnudadas que cercam agora o vale. É uma paisagem inóspita e agreste que acompanha a caminhada até às portas do “Povo”. E não fora o grasnar nasalado dos frequentes bandos de gralhas-pretas (Corvus corone) que se vislumbram em acrobacias sobre as penedias, o ocasional voo planado de uma águia-de-asa-redonda (Buteo buteo) ou o gorjeio inconfundível de um melro-azul (Monticula solitarius), dir-se-ia ser esta uma terra deserta de vida, num outro qualquer vale recôndito, e não a porta de entrada no precioso “Jardim da Pena”.

A lenda da Pena e do Santo Macário

Terminada a caminhada, e enquanto retemperamos forças para o regresso a casa, o tempo sobra para dois dedos de conversa com as gentes de Covas do Rio. Afáveis, prestáveis e hospitaleiros, dão largas à memória assim que os inquirimos acerca das tão afamadas lendas da Pena e do S. Macário, dando corpo e voz à expressão popular que afiança “quem conta um conto, acrescenta um ponto”. E de ponto em ponto, fruto da imaginação, dos lapsos de memória, ou do passar do tempo, as histórias que nos vão sendo contadas lá vão adquirindo os contornos e significados que cada um lhe pretende dar. E o mais curioso sobre estas duas lendas é que ambas mantêm uma origem comum mas surpreendem com finais distintos. Ora, diz então a lenda que “em tempos idos existia uma aldeia no coração da Serra de S. Macário, no lugar a que chamam Cova da Serpe. O local, para além de albergar a aldeia, era também residência de uma enorme e malévola serpente-dragão. O animal, daninho como era, descia pela noite ao povoado e provocava verdadeiras razias em gentes e animais, deixando estéreis os campos por onde se arrastava”. E é aqui que as histórias se separam. A lenda da Pena continua da seguinte forma: “a população, amedrontada e farta de perder assim o seu parco sustento resolveu abandonar a aldeia e mudar-se para um outro local. O sítio escolhido foi um vale vizinho, do outro lado da serra (onde hoje se encontra a aldeia), profundo e quase inacessível protegido por gigantescas fragas. Finalmente livres do assombro da serpente os habitantes respiraram de alívio. No entanto, nunca lograram esquecer totalmente a sua antiga aldeia, e por isso se lamentavam pelo seu abandono: que pena... que pena que foi - diziam! A verdade é que o desgosto e a pena foram de tal ordem que o nome acabou mesmo por ficar, e hoje não há nesta região quem não conheça a sorte das gentes da Pena”. A lenda de S. Macário, por seu lado, guarda um final diferente: “Um dia S. Macário matou o monstro e sossegou a população ficando a morar como eremita, primeiro na Cova da Serpa e depois na Capelinha que lhe construíram os aldeões no alto do Monte. E assim, em homenagem ao Santo e à sua boa acção, a capelinha e o monte onde foi construída receberam o seu nome”.

 

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